Brasil na vanguarda da mobilidade sustentável e da descarbonização

Santander DATAGRO Abertura de Safra – Cana, Açúcar e Etanol, tradicional evento de arranque da n


Edição 42 - 27.05.24

Santander DATAGRO Abertura de Safra Cana, Açúcar e Etanol, tradicional evento de arranque da nova temporada do setor sucroenergético, reuniu 1,7 mil pessoas em Ribeirão Preto (SP) 

Por Ronaldo Luiz  

Nos dias 6 e 7 de março, representantes do setor sucroenergético estiveram reunidos em Ribeirão Preto (SP) para o 8º Santander DATAGRO Abertura de Safra – Cana, Açúcar e Etanol 2024/25. O Taiwan Centro de Eventos recebeu 1,7 mil pessoas, entre empresários, executivos de usinas, produtores, fornecedores e lideranças políticas. Realizada de maneira híbrida, a oitava edição do Abertura de Safra também contou com público on-line. Presencial ou a distância, todos os envolvidos tiveram acesso aos insights dos mais renomados especialistas para o planejamento da temporada 2024/25. 

Com a presença de autoridades, como representantes de ministérios, secretários de Agricultura e parlamentares, dirigentes setoriais, usineiros, produtores de cana, executivos de empresas de insumos e do mercado financeiro, entre outros agentes envolvidos com a cadeia produtiva do setor sucroenergético, a solenidade de abertura destacou a relevância de Projetos de Lei em tramitação no Congresso Nacional, em particular o do “Combustível do Futuro” (PL 4.516/23), para a consolidação de políticas públicas favoráveis à mobilidade sustentável e de descarbonização por meio da adoção de biocombustíveis na matriz de transportes no Brasil. Já aprovado na Câmara dos Deputados, o PL do Combustível do Futuro passava por análise do Senado até o fechamento desta edição.  

Em linhas gerais, a proposta contempla três itens-chave para o setor agro de energia limpa e renovável: etanol, biodiesel e biometano. Entre outros pontos, a matéria endereça avanços no uso do etanol, incluindo a ampliação da faixa de variação para até 35% de adição à gasolina, além do uso de etanol de milho e outras fontes. No caso do biodiesel, engloba a mistura do biocombustível no diesel – hoje em 14% –, com previsão de chegar a 20% e até mesmo 25% em breve.  

O PL do Combustível do Futuro coloca o Brasil na vanguarda do controle de emissões de gases de efeito estufa e de iniciativas concretas para descarbonização”, ressaltou o presidente da DATAGRO, Plinio Nastari, que acrescentou: “O projeto também abarca critérios para medição de emissões do berço ao túmulo em todo o ciclo de produção automotiva, o que vai ao encontro das entregas ambientais dos biocombustíveis”.  

Uma das autoridades presentes à cerimônia, o diretor do Departamento de Biocombustíveis do Ministério de Minas e Energia (MME), Marlon Arraes, acentuou que o PL do Combustível do Futuro é um marco para a indústria nacional de biocombustíveis. Arraes adiantou que a pasta abrirá a agenda de trabalho com o objetivo de discutir a viabilidade de elevação da mistura de 30% do álcool anidro na gasolina.  

Entre outros destaques da solenidade de abertura, o vice-presidente da Orplana, Bruno Rangel, lembrou do potencial do Brasil para a fabricação de combustível sustentável para aviação (SAF, na sigla em inglês), e a Head Corporate Agro do Santander, Caroline Perestrelo, lembrou da oportunidade que o Brasil terá na Conferência do Clima da ONU em 2025 para apresentar todo o seu potencial em energia limpa e renovável, citando, por exemplo, o RenovaBio (Política Nacional de Biocombustíveis). 

Safra de Centro 592 milhões de toneladas  

O primeiro painel do evento destacou as previsões da DATAGRO para a temporada 2024/25. A consultoria prevê 592 milhões de toneladas de cana para o Centro-Sul, volume 9,8% inferior ao do ciclo 2023/24. Em relação à produção de açúcar, projeta-se 40,45 milhões de toneladas para a região, que, caso se confirme, representaria queda de 4,8% ante a temporada anterior – mix açucareiro de 51,6% (+2,7%). Já a produção de etanol é estimada em 30,42 bilhões de litros, recuo de 9,3% ante 2023/24 – 14,20 bilhões de litros de anidro (+5,1%) e 16,22 bilhões de litros de hidratado (-19%). Segundo a DATAGRO, com a recuperação do consumo de etanol, os preços aos produtores devem reagir na safra 2024/25. 

Safras na Índia e Tailândia  

A DATAGRO prevê que a safra 2023/24 de açúcar da Índia deve fechar em 32,4 milhões de toneladas – considerando 1,74 milhão de toneladas de açúcar equivalente desviadas para o etanol –, próximo ao volume de 2022/23. Para o ciclo 2024/25, a consultoria projeta a produção indiana do adoçante em 31 milhões de toneladas, considerando 2,8 milhões de toneladas de açúcar para o biocombustível. 

A estimativa da produção de açúcar na Tailândia na safra 2023/24 é de 8,4 milhões de toneladas. Para o ciclo 2024/25, a DATAGRO destaca que há uma tendência de alta, uma vez que o preço da cana se recuperou, superando o retorno do cultivo de outras culturas, a exemplo da mandioca. Na oportunidade, Ulysses Carvalho, trader sênior da Sucden, lembrou, ainda, da capacidade de crescimento da Indonésia, que desponta como uma potência no Sudeste Asiático. 

Melhoramento genético da cana 

Especialistas reunidos em painel sobre tecnologia para a cultura da cana discorreram sobre desafios e oportunidades para novos avanços nos processos de melhoramento genético da planta em busca de menos custos e mais produtividade dos canaviais. O presidente da CropLife Brasil, Eduardo Leão, destacou que, do ponto de vista de tecnologia agrícola, a cana-de-açúcar é a cultura do agro brasileiro que mais utiliza o controle biológico para o combate a pragas e doenças, com mais de 50% da área plantada protegida por esse modelo.  

Além disso, o setor sucroenergético também vem adotando cada vez mais o uso de variedades transgênicas. No entanto, segundo Leão, o Brasil carece de um ambiente regulatório mais estável, que possa tanto preservar esses avanços quanto atrair novos investimentos em pesquisa e inovação.  

O diretor da empresa argentina Chacra Experimental Agrícola, Germán Serino, lembrou que o melhoramento genético da cana está atrasado se comparado ao que é desenvolvido para os grãos: Na cana, o investimento está mais setorizado por país e com menor participação de multinacionais”. Por sua vez, o diretor executivo da Boyd Biotech do Brasil, William Burnquist, pontuou que o segmento busca novas cultivares, com maior variabilidade genética, que possam assegurar o potencial produtivo dos canaviais.  

Produtividade dos canaviais  

Modelo de projeções da DATAGRO estima queda de 10,7% na produtividade média dos canaviais, prevista em 78,8 toneladas por hectare, na safra 2024/25, o que coloca o rendimento das lavouras como principal desafio de contraponto aos custos de produção do próximo ciclo. Foi o que destacou o analista de dados da DATAGRO, Paulo Bruno Craveiro. “Mesmo com a estimativa de queda, a produtividade ficará acima do rendimento médio registrado nas últimas cinco safras.” 

Segundo Craveiro, no que diz respeito aos custos, a expectativa é de recuo nos preços dos principais insumos agrícolas (defensivos e fertilizantes) para a temporada 2024/25. Conforme o analista, os valores de arrendamento da terra devem ficar estáveis, enquanto a mão de obra pode apresentar ligeira alta. “Já o diesel deve ter leve aumento, devido à recomposição dos impostos federais e da elevação da mistura de biodiesel.” De acordo com Craveiro, com a projeção de menor oferta, o preço pago ao fornecedor de cana avançará 6,6%. 

Também participantes do painel, o diretor financeiro da Usina Lins, Celso Roxo, e o diretor administrativo da Usina Cocal, Ailton Santos, citaram a boa gestão de riscos e hedge de preços, assim como investimentos em tecnologia, em tratos culturais e cuidado especial com a mão de obra como medidas fundamentais para manutenção da competitividade e saúde financeira da operação.  

Análise de risco socioambiental 

A análise de risco socioambiental de atividades agropecuárias, o que inclui o setor sucroenergético, ganha terreno como critério nas operações de financiamento agrícola e crédito rural, destacou a head Corporate Agro do Santander Brasil, Caroline Perestrelo: “A diferenciação entre o negócio que segue princípios de ESG e o que não segue já é considerada pelo financiador para concessão de recursos”. De acordo com a executiva, o Santander já tem feito operações de crédito com fundos específicos, a fim de canalizar investimentos para negócios com etanol e de proteção de florestas. “Não são linhas de prateleira, mas já existe este endereçamento.” 

O painel também contou com a participação do gerente operacional da Peterson Projects & Solutions, Danilo Blanco, e do gerente comercial da Grunner, André do Amaral, que falaram, respectivamente, que seguir os preceitos de ESG faz o negócio agrícola se tornar mais resiliente e que o uso de máquinas inteligentes no campo reduz a pegada de carbono da atividade, com a diminuição, por exemplo, do consumo de diesel.  

Plantio mecanizado 

Intitulado “Inovações em Plantio para Aumento de Eficiência”, o painel deixou como principal recado que, entre idas e vindas de plantio manual e mecanizado, quem persistiu no último obteve mais êxito. “Tratos culturais e colheita já estão com a mecanização mais avançada, diferentemente da etapa de plantio”, disse o consultor sênior da DATAGRO, Valmir Barbosa. 

De acordo com o gerente de Marketing da DMB Máquinas e Implementos Agrícolas, Auro Pardinho, dados do Instituto Agronômico de Campinas (IAC) mostram que o plantio mecanizado na cana diminuiu de 80% em 2018 para empatar em termos de adoção de uso com o manual em 2021. “Com o avanço da tecnologia, o plantio mecanizado traz maior assertividade na operação, com menos falhas.” 

O painel também contou com a participação dos gerentes agrícolas da Usina São Manoel e Alta Mogiana, respectivamente, Murilo Gasparoto e Luiz Augusto Contin, que discorreram sobre a experiência do plantio mecanizado em seus grupos.

Combate a incêndios, fertilização e controle de pragas 

O consultor sênior da DATAGRO, Valmir Barbosa, pontuou que as medidas de prevenção e controle de incêndios precisam ser discutidas em nível estratégico das empresas, não ficando restritas à tomada de decisão das equipes operacionais de combate ao fogo. “É um tema sensível, porque traz riscos aos ativos de negócios, ambientais e de mão de obra da empresa.” 

Já o CEO da Agrion, Ernani Judice, abordou o modelo de negócios da empresa, especializada na fabricação de fertilizantes organominerais, com a instalação de plantas dentro ou muito próximas às usinas. Nesse formato, salientou o executivo, resíduos do processamento da cana, como a torta de filtro e vinhaça, são utilizados como matérias-primas para produção do adubo.  

Um primeiro case já está em operação com a usina Aroeira, em Minas Gerais, que passou a ser autossuficiente em fertilizantes, com o excedente passando a ser comercializado no mercado. “Esse modelo propicia redução de custos de produção e logísticos para as usinas, bem como dá mais previsibilidade para a oferta do insumo e também cria uma nova fonte de receita.” 

O professor da Unesp, Odair Fernandes, alertou que o inseto conhecido popularmente com o “bicudo da cana” é a maior ameaça aos canaviais paulistas, do Mato Grosso do Sul e de Minas Gerais, com sua infestação sobrepondo-se às da cigarrinha e da broca. Segundo Fernandes, os modelos de manejo integrado de combate a pragas e doenças não estão dando conta do controle eficaz do bicudo e que a principal recomendação hoje é evitar sua presença a qualquer custo.   

RenovaBio como indutor de eficiência  

A busca pela geração de CBios (Certificados de Créditos de Descarbonização), peça-chave da Política Nacional de Biocombustíveis (RenovaBio), que são adquiridos pelas distribuidoras de combustíveis e precisam cumprir metas de redução de emissões, está fazendo com que, além de se tornarem mais sustentáveis, as usinas de biocombustíveis passem também a registrar ganhos de eficiência, tanto nas atividades agrícolas quanto nas operações agroindustriais, com resultados para todo o negócio.  

Foi o que destacou o head de Relações Internacionais da Embrapa, Marcelo Morandi. Em sua exposição, o pesquisador explicou que a jornada de descarbonização realizada pelas usinas para se tornarem elegíveis a ingressarem no RenovaBio vem fazendo com que as empresas tenham que usar de maneira mais racional os insumos agrícolas, diminuir o consumo de combustíveis no maquinário, em particular o diesel, refinar toda a cadeia de processos, e assim por diante.  

De acordo com Morandi, essas medidas promovem automaticamente a mitigação da pegada de carbono das usinas e, ao mesmo tempo, endereçam menos custos, incrementos de produtividade e maior assertividade na realização das tarefas do dia a dia do negócio. “Os números mostram isso: de 2020 a 2023, tivemos a geração de 800 mil CBios a mais com a mesma capacidade instalada do setor de biocombustíveis”, disse. 

Também participaram do painel o CEO da JBR Engenharia Industrial, João Bortolussi; o gerente industrial do Grupo São Martinho, Fernando Cullen; o presidente da Cerradinho Bioenergia, Paulo Motta; e o diretor-geral da SJC Bioenergia, Abel Uchoa. Eles falaram sobre os desafios e oportunidades da integração cana e milho para a produção de etanol.