Um gigante vulnerável

O professor Marcos Fava Neves, economista da USP de Ribeirão Preto e um dos maiores estudiosos das


Edição 29 - 03.06.22

O professor Marcos Fava Neves, economista da USP de Ribeirão Preto e um dos maiores estudiosos das cadeias produtivas do agronegócio, já fez as contas. A cada minuto, o Brasil exporta mais de R$ 1 milhão em produtos agropecuários. Mais de 200 países são clientes de nossos produtores e empresas e a pauta de itens vendidos é bastante diversificada. Ao final de 2021, contabilizamos mais de US$ 120 bilhões em vendas externas, um crescimento de quase 20% em relação ao ano anterior. Com importações na casa de US$ 15 bilhões, o setor registrou um superávit superior a US$ 105 bilhões.

São dados de dar orgulho a quem produz. Apresentados assim, friamente, parecem desenhar um cenário confortável para o País e para os exportadores. Quando se olha a imagem com lupa, percebe-se, porém, sinais de que é preciso cautela espalhados por toda parte. Se exportar é o que importa (e realmente é importante), talvez seja hora de nos importarmos também com a qualidade dessas vendas e da política externa brasileira. Afinal, cerca de dois terços das exportações do agronegócio estão concentrados em apenas dez países clientes.

Os dois principais, China e União Europeia, são o destino de nada menos do que 47,5% dos embarques de produtos agrícolas brasileiros. Concentração semelhante se encontra nas commodities exportadas. Nosso principal produto, a soja, representa 14% do total das exportações brasileiras (não apenas as agrícolas). Somente a China compra cerca de 70% desse volume.

A incerteza que ronda a geopolítica global, aliada a esse quadro de imensa dependência das vontades de uns poucos clientes, nos indica que, ao invés de uma fortaleza, temos no flanco comercial externo uma possível vulnerabilidade. Em tempos assim, a inteligência e a sutileza são armas fundamentais para o sucesso da diplomacia comercial. A China já informou ao mundo que tem um plano para aumentar em 40% sua produção de soja até 2025, reduzindo dramaticamente a dependência de compras externas – e também aumentando a demanda interna por fertilizantes e defensivos, o que certamente trará impactos nos mercados globais desses produtos. Já a União Europeia a cada dia eleva o nível de barreiras ambientais impostas às commodities brasileiras.

Falar grosso e fechar os olhos para essas questões não manterá esses mercados abertos. Tampouco abrirá outras portas para nossos produtos. Entender o que os clientes querem é o que faria um bom vendedor.