Para que valem os concursos de vinhos

Por volta das 23h da noite de 8 de junho, a temperatura no Vale do Vinhedos estava em torno de 6º C


13.06.18

Irineu Guarnier Filho é jornalista especializado em agronegócio, cobrindo este setor há três décadas. Metade deste período foi repórter especial, apresentador e colunista dos veículos do Grupo RBS, no Rio Grande do Sul. É Sommelier Internacional pela Fisar italiana, recebeu o Troféu Vitis, da Associação Brasileira de Enologia (ABE), atua como jurado em concursos internacionais de vinhos e edita o blog Cave Guarnier. Ocupa o cargo de Chefe de Gabinete na Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul, prestando consultoria sobre agronegócio

Por volta das 23h da noite de 8 de junho, a temperatura no Vale do Vinhedos estava em torno de 6º C, e caindo. No salão aquecido do SPA do Vinho, Hotel & Condomínio Vitivinícola, onde acontecia a entrega dos prêmios aos vencedores do Brazil Wine Challenge 2018, a temperatura subia à medida que iam sendo anunciados os ganhadores de medalhas de Ouro e Gran Ouro do certame internacional que reuniu, na Serra Gaúcha, vinhos e desgustadores dos principais países vinícolas e de outros menos tradicionais, como Bolívia, Bulgária, China e México (a Bolívia levou uma Medalha de Ouro). Entre abraços, aplausos e muitos brindes, comemorava-se neste ano o excelente desempenho do Brasil, do Chile e de Portugal, países que conquistaram o maior número de medalhas e dividiram o prêmio máximo do evento, as medalhas Gran Ouro.

Organizado pela Associação Brasileira de Enologia (ABE), o único concurso no país  com a chancela da Organização Internacional da Vinha e do Vinho (OIV) e da União Internacional de Enólogos (UIOE), exibiu números expressivos: das 611 amostras inscritas por 18 países, 193 foram premiadas, sendo 8 com Medalha Gran Ouro (vinhos cotados entre 93 e 100 pontos) e 185 com Medalha de Ouro (de 88 a 92,9 pontos). “Não tivemos nenhuma Medalha de Prata. Isso porque os 30% mais pontuados atingiram nota para Medalha Gran Ouro e Ouro, numa demonstração de excelência”, explicou o presidente da ABE, enólogo Edegar Scortegagna.

Seis júris, formados por 50 enólogos, sommeliers e jornalistas especializados, avaliaram durante três dias uma média diária de 34 amostras de vinhos espumantes, brancos, rosés, tintos e destilados cada um, totalizando 13 horas de degustações. Já em sua nona edição, o BWC foi reconhecido pela vice-presidente da OIV, Claudia Quini, como “um dos principais momentos dos vinhos no Brasil e na América Latina”.

Claudia Quini

Sempre me perguntam o que acho de concursos de vinhos. Como já participei dos júris deste e de outros concursos sérios internacionais, costumo dizer que, independentemente de uma ou outra medalha controversa, concursos são excelentes oportunidades para as vinícolas divulgarem suas marcas e receberem um feedback abalizado sobre seus vinhos. Embora as medalhas estejam um tanto banalizadas hoje em dia, ainda conferem certo status aos produtos. É inegável que o bebedor leigo, diante da enorme oferta de rótulos, olhe com mais atenção para vinhos “medalhados”. Medalha não é um fator decisivo para a compra, mas certamente funciona como uma referência a mais quando há muitas opções e poucas informações para dificultar a escolha.

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Para as vinícolas, o retorno de uma participação em concurso não pode ser medido objetivamente. Quando seus vinhos são premiados, indiscutivelmente há ganhos de marketing. Veredito que pode (ou não) servir de orientação para consumidores iniciantes ou indecisos (como ocorre com a crítica especializada de livros ou filmes). E, se não houver prêmio, também não haverá prejuízo: os bons concursos não divulgam os nomes dos vinhos não classificados. Ainda assim, muitas vinícolas de renome preferem não participar de competições.

Vinhos medianos – mais do que rótulos de alta gama – têm sido muito bem avaliados em concursos nacionais e internacionais. Por quê? Provavelmente porque as vinícolas estão mais interessadas em obter reconhecimento para vinhos destinados a um público mais amplo – que “rodam” mais nas lojas, restaurantes e supermercados – e por isso enviam aos concursos uma quantidade maior de amostras dessa linha. Mas também porque os ícones da casa já são reconhecidos pelos enófilos e contam com um público cativo. Além do que, sempre é mais interessante para o departamento de marketing da vinícola ganhar uma medalha de ouro com um vinho médio do que uma medalha de prata com um rótulo premium, não?

Edegar Scortegagna

O mais importante, porém, é que as avaliações, apesar de sérias em todos os concursos de que participei, não podem ser sacralizadas. Elas expressam a percepção (em grande parte subjetiva) de um determinado grupo em um determinado momento sobre vinhos de uma determinada safra – que podem ser avaliados de modo diferente por outro júri em outro lugar e em outra ocasião. São, portanto, apenas uma referência, nunca uma sentença definitiva sobre um vinho. Por isso, cada enófilo deve beber o vinho que mais lhe agrada, do jeito que mais gosta, independentemente de pontos ou de medalhas.

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