Nas máquinas agrícolas, a força da inovação

Equipamentos inteligentes, conectados e sustentáveis redesenham o futuro da atividade rural e transformam o produtor em gestor de dados no campo
Edição: 49
18 de julho de 2025

Por Amauri Segalla

O som dos motores marca presença na paisagem rural brasileira, mas o que realmente move o campo atualmente é uma força ainda mais transformadora: a inovação. A imagem tradicional do trator robusto, operado com esforço físico, deu lugar a um cenário dominado por máquinas cada vez mais inteligentes, conectadas e autônomas. Equipamentos agrícolas modernos vêm embarcados com sensores, inteligência artificial e sistemas de telemetria que não apenas automatizam tarefas, mas também redesenham o papel do produtor rural, hoje em dia um gestor de dados capaz de tomar decisões em tempo real com base em variáveis cada vez mais complexas. O Brasil já ocupa a quarta posição no mercado global de tratores e colheitadeiras, atrás apenas de potências como Estados Unidos, China e Índia. Nesse contexto, a inovação embarcada nas máquinas não é apenas uma resposta à demanda por maior produtividade – ela se tornou, na verdade, a principal engrenagem do avanço no campo.

Mais do que colocar máquinas na lavoura, o desafio agora é transformar o que elas são capazes de fazer. Os números mostram que, de fato, uma revolução está em curso. Um estudo realizado recentemente pelo Sebrae constatou que 84% dos agricultores brasileiros utilizam algum tipo de tecnologia digital em suas propriedades. Esse movimento acompanha o desempenho do setor de máquinas agrícolas, que cresceu 23% no acumulado do ano até maio em comparação com o mesmo período de 2024, segundo levantamento da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq). O avanço é impulsionado pela pressão crescente por eficiência, pelo fortalecimento de linhas de crédito que facilitam a renovação da frota e, num aspecto ainda mais importante, pela consolidação da agricultura de precisão. “A agricultura de precisão se consolidou como uma das principais ferramentas para garantir sustentabilidade e eficiência na produção”, diz Lucas Zanetti, gerente de Marketing de Produto da Massey Ferguson, marca do grupo AGCO

A modernização se dá em múltiplas frentes. As máquinas ganham autonomia progressiva, executando manobras e ajustando parâmetros sem intervenção humana. Tratores equipados com sensores adaptam a velocidade ao tipo de solo. Pulverizadores conectados leem as condições climáticas em tempo real e aplicam defensivos apenas nas janelas ideais. “A automação já não é promessa: é realidade”, diz Zanetti. “E a inteligência artificial potencializa essa mudança.”

A evolução tecnológica também avança na eficiência energética. Um exemplo é o MF 8S, da Massey Ferguson, que combina telemetria com um motor de baixo consumo. O conjunto com a plantadeira Momentum permite semear com precisão milimétrica, otimizando insumos e evitando sobreposições. Por sua vez, o sistema Apply Granular reduz em até 50% a aplicação de fertilizantes, com ganhos ambientais e econômicos.

Marcas como a Fendt têm reforçado essa abordagem com soluções voltadas à descarbonização. A Fendt apresentou recentemente o trator 728 Vario Gen7, equipado com o motor AGCO Power Core75, que opera com combustíveis alternativos como HVO, etanol e biogás. “A descarbonização não é apenas uma tendência, mas um imperativo do mercado”, afirma Fernando Silva, coordenador comercial da AGCO Power. A eficiência energética também se estende à colheitadeira Ideal 25, projetada para operar a 1.900 rpm com menor consumo de combustível e longos intervalos entre manutenções. Mais do que motores potentes, as máquinas trazem inteligência embarcada. A Ideal 25 integra sistemas como o AirSense, que evita superaquecimento, e o AutoTurn, que realiza manobras automaticamente. Segundo a marca, essas tecnologias aumentam a produtividade e reduzem a fadiga do operador.

A inovação é uma característica das diversas marcas do grupo AGCO. A Valtra, por exemplo, lançou a Série S6, com tratores de até 425 cv voltados a operações pesadas como cana e grãos. A barra de pulverização de 42 metros da linha R, feita com aço, alumínio e fibra de carbono, reduz peso e custos de manutenção. E a marca aposta no consórcio como alternativa de financiamento – a modalidade cresceu 30% em cinco anos, com 800 contemplações apenas nos últimos dois.

O agro brasileiro se tornou, de fato, um polo de inovação tecnológica. Em Horizontina (RS), a fábrica da John Deere, considerada um dos berços da mecanização agrícola no País, passou por uma ampla transformação para atender à nova era da agricultura digital. Após um período de desaquecimento em 2024, que incluiu suspensão temporária da produção, a unidade foi revitalizada com a instalação de uma rede privada 5G, iniciativa que colocou a planta entre as mais modernas da companhia no mundo. A conectividade permitiu integrar dados em tempo real à linha de produção e ampliar a automação industrial.

Com cerca de 1,5 mil funcionários, a fábrica retomou operações em três turnos e voltou a produzir modelos estratégicos como as plantadeiras Série 1200 e 3100, voltadas à agricultura de precisão. “Esse mercado é cíclico”, diz Sandro Bertagnolli, gerente operacional da unidade. “Quando retoma, retoma com força.” O otimismo com o setor agrícola também se refletiu no lançamento da colheitadeira S7, equipada com tecnologias preditivas de velocidade, que ajustam automaticamente o deslocamento da máquina antes mesmo do corte, e com sistemas inteligentes que configuram os parâmetros operacionais com base na cultura, no solo e na localização geográfica. O resultado é um salto de até 10% na qualidade dos grãos e redução equivalente nas perdas.

Enquanto algumas fabricantes investem em máquinas de alta potência, empresas como Mahindra e Agritech têm ampliado seu protagonismo com foco na agricultura familiar. Em pequenas propriedades, especialmente aquelas com até 20 hectares, a demanda é por soluções simples, robustas e de manutenção acessível, características que têm guiado os lançamentos das duas empresas.

Na Agrishow 2025, a Mahindra apresentou uma linha voltada ao pequeno e médio produtor, incluindo o trator OJA 3140, de 40 cv, projetado para atender culturas hortícolas, e a retroescavadeira VX90. A empresa também mostrou uma plantadora de batatas e reforçou a oferta de tratores na faixa de 25 a 110 cv, com destaque para o modelo 8110, fabricado no Brasil. A proposta da marca indiana é combinar economia de combustível, robustez e facilidade de operação com as realidades do campo brasileiro. “Queremos oferecer soluções adaptadas ao pequeno produtor”, afirma Jak Torretta, presidente da Mahindra no Brasil.

A Agritech, tradicional fabricante nacional com foco na agricultura familiar, lançou os microtratores AF14 e AF14 S. Compactos e versáteis, os modelos têm 14 cv de potência, câmbio com nove marchas e a possibilidade de operação como motores estacionários para bombas, geradores ou picadeiras. O modelo AF14 S traz ainda uma enxada rotativa acoplada. Ambos se apresentam como alternativa acessível para agricultores que buscam mecanização inicial. “É uma porta de entrada para o pequeno agricultor na mecanização de qualidade”, diz Cesar Roberto Guimarães de Oliveira, gerente de Vendas e Marketing da Agritech.

A atenção às necessidades do pequeno produtor também tem impulsionado inovações no segmento de equipamentos portáteis e de aplicação localizada, área em que a Jacto tem se destacado. Durante a Hortitec 2025, realizada em Holambra (SP), a empresa apresentou uma série de lançamentos voltados à horticultura e fruticultura, com foco em conforto, eficiência e tecnologia de dados. Um dos destaques foi o pulverizador a bateria SB-20D, que se diferencia pela redução de até 30% da carga sobre os ombros, graças a um sistema de cintas e base acolchoadas.

A marca também lançou o DJB-S, primeiro pulverizador costal com geração de mapas e relatórios de aplicação georreferenciados via smartphone, uma inovação voltada à rastreabilidade e ao controle preciso do uso de insumos em pequenas áreas. Completando a linha, o SB-18P, com dupla bateria de lítio-íon, oferece maior autonomia e vazão, ideal para longas jornadas no campo. Além dos pulverizadores, a Jacto reforçou sua linha de equipamentos de poda com tesouras de alta durabilidade, machados com cabo de fibra de vidro e acessórios projetados para garantir aos produtores conforto no uso contínuo do equipamento.

Na esteira do avanço tecnológico, a conectividade tornou-se a ferramenta que integra todas as soluções voltadas para o campo, das mais simples às mais complexas. Para máquinas cada vez mais inteligentes e autônomas, operar desconectado é praticamente inviável. É nesse contexto que a CNH Industrial deu um passo estratégico ao firmar parceria com a Starlink, da SpaceX, gigante que pertence ao bilionário Elon Musk, levando internet via satélite às máquinas das marcas Case IH, New Holland e Steyr.

Com cobertura em áreas remotas e baixa latência, a conexão garante comunicação em tempo real entre máquinas e plataformas digitais como o FieldOps, permitindo gestão agronômica à distância, atualizações remotas e integração com sistemas de prescrição. Um exemplo prático está na pulverização inteligente: imagens de drones processadas pelo sistema FieldXplorer viram mapas de aplicação que são transmitidos quase instantaneamente às máquinas que estão em operação no campo, permitindo respostas rápidas ao aparecimento de plantas daninhas e otimizando o uso de insumos.

A revolução tecnológica no campo brasileiro não é mais uma aposta de futuro, mas uma realidade que se consolida a cada safra, transformando profundamente o modo de produzir. A mecanização, aliada à inteligência artificial e à conectividade, torna possível enfrentar os grandes desafios da agricultura: aumentar a produtividade sem ampliar a área plantada, reduzir o impacto ambiental das atividades no campo, lidar com eventos climáticos extremos e manter a competitividade global. Tudo isso enquanto o trator segue seu curso pela lavoura – agora não mais como símbolo de força bruta, mas de uma agricultura cada vez mais conectada, eficiente e inteligente.

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