21.01.19
Nas redes sociais tem circulado um “meme”, que é um formato de conteúdo de humor ou paródia que viraliza rapidamente pela web, onde se coloca à prova uma questão essencial para a atividade rural no cotidiano atual, a educação.
Fazendo aqui a descrição da cena, um pai se dirige ao filho, num recado direto e cheio de sabedoria sobre a realidade agrícola do passado e do presente:
– “Se ontem você ficava no campo porque não estudava…”
– “Hoje para ficar na roça, você vai ter que estudar! ”
Importante como nunca, fundamental como sempre, a educação é insumo vital para a profissionalização, gestão e continuidade dos negócios nas próximas gerações. Dentro e fora da porteira.
Infelizmente, não é de hoje o gargalo de se fazer chegar o ensino de qualidade aos rincões mais distantes e produtivos do nosso país. Mas, a depender de iniciativas que já representam a cooperação dos setores público e privado para reverter este quadro, há uma luz no fim da trilha que nos permite acreditar num futuro fértil e melhor.
Nesta frente destaca-se o Senar – Serviço Nacional de Aprendizagem Rural – com atividades de formação profissional e assistência técnica para pequenos produtores e trabalhadores rurais. Já na outra ponta, representando o investimento das corporações, há um foco para os sucessores e a disseminação de práticas de gestão para as grandes famílias produtoras, como o Agrolíderes Rabobank e a Academia de Líderes Sucessores Syngenta.
Com a revolução da agricultura digital e a inovação tecnológica cada vez mais presentes nas lavouras, o modelo formal de escolas e faculdades também está em transição para um formato mais prático e atualizado para reduzir o descompasso entre academia e mercado, dando possibilidades para quem, inclusive, pretende empreender.
Isso já é uma realidade em incubadoras, aceleradoras e hubs de inovação responsáveis por ensinar e desenvolver o potencial empreendedor de estudantes, pesquisadores e startups agrícolas, as agtechs. Melhor ainda é saber que este é um movimento que já está ocorrendo em diferentes ecossistemas, com destaque para o Pulse/Raízen e os agentes do Agtech Valley em Piracicaba, Go SRP Agritech em Londrina e o Agrihub em Cuiabá.
Isso sem falar em outro exemplo de Pompeia, no interior paulista, com a atuação da Jacto e de sua Fundação Shunji Nishimura, abrigando em seu campus unidades parceiras do Senai e da Fatec, com destaque para o curso de big data no agronegócio.
São iniciativas como esta que ajudam a elevar a qualidade e levar o ensino ao campo, semeando a agricultura 4.0, permitindo que a inovação seja cultivada dentro das fazendas.
Com a extensão rural, a educação sai das salas de aulas e mobiliza quem está diretamente em contato com a atividade produtiva. Com didática presencial ou à distância, física ou digital, além das tradicionais cartilhas, são utilizados também formatos lúdicos e de mais fácil compreensão ao homem do campo, como as histórias em quadrinhos.
Pois vem justamente dos gibis um causo emblemático de quem não ficou parado no tempo e foi em busca de instrução para acompanhar a evolução do nosso caipirismo: Chico Bento Moço.
Pela reação do público das cidades e pelo baixo nível de conhecimento da real importância da atividade rural em nosso país, há uma certa controvérsia na afirmação de que “o agro é pop”. Mas, sem dúvida, Chico Bento é um ícone da roça muito querido pelo público urbano e que sempre esteve presente em muitos lares do Brasil.
Agora numa versão jovem, Chico Bento Moço segue uma nova trajetória ao decidir estudar agronomia para resolver os problemas de sua região. São aventuras e novas interações que elevam o roteiro a outro nível, passando por temas como a socialização na república estudantil, ataque de drones e o desaparecimento das abelhas.
Mais interessante do que a evolução em busca da sua formação acadêmica, é o fato de que o mesmo personagem surgiu com a finalidade de entreter e educar o homem do campo. Criado em 1963, para um papel coadjuvante, Chico Bento fazia parte das tirinhas de Hiro e Zé da Roça, publicadas na revista da Cooperativa Agrícola de Cotia – SP.
Chico ganhou status de protagonista com a sua própria revista apenas em 1982, como parte da estratégia de Maurício de Souza, seu criador, para aumentar o portfólio de estrelas da turma da Mônica.
A evolução de Chico Bento não se restringe apenas à cronologia, mas também ao formato de suas histórias em atenção a maturidade do seu público de leitores, que passaram a consumir conteúdos em diferentes formatos e hoje, como adultos, já apresentam o “caipirês” e os valores da roça para seus filhos que aprendem a ler em novas mídias.
É o caso das graphic novels “Arvorada” e “Pavor Espaciar”, o livro de receitas a “Cozinha Caipira do Chico Bento” feito em parceria com o Chef Jefferson Rueda, proprietário do descolado restaurante “A Casa do Porco”, e também no formato de animação com os curtas do “Chico Bento Toy”.
Num misto de orgulho e nostalgia, lembrando do tempo em que eu aprendia a ler ao folhear os meus gibis, reconheço em Chico o carisma de um dos porta-vozes mais importantes do nosso setor. Sua influência supera as barreiras das idades e, dos mais diversos títulos e heróis que habitam o universo dos quadrinhos, é ele quem ainda carrega a bandeira do interior do Brasil.
Suas histórias preservam a identidade e a cultura caipira, com elementos do folclore e do sertanejo raiz. Destacam também a importância das relações sociais neste meio, do ambiente familiar às interações em sala de aula com a professora “Dona Marocas”.
Para uma revista que começou com a pretensão de contar as peripécias de uma versão mirim do Jeca Tatu, outro célebre personagem capiau da literatura criado por Monteiro Lobato, Chico Bento nos dá uma lição de como o agro pode seguir firme em sua evolução, sem deixar de lado a sua simplicidade de modos e costumes.
Se é escrito com o canivete no pé de goiabeira ou digitado na tela do smartphone, para um final feliz no agro, “pra lá de bão”, precisamos dar asas à inovação sem deixar de lado a educação.
Para saber mais sobre a origem do Chico Bento e a criação da revista Chico Bento Moço, confira entrevista do Maurício de Souza clicando aqui ou se aventure na biografia do autor que também tem raízes caipiras, no livro: “Maurício, a História que não está no Gibi”.
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