A explosão dos Fiagros

Fundos de investimento em diferentes modalidades do agronegócio viram febre no mercado e atraem inv


Edição 39 - 29.10.23

Fundos de investimento em diferentes modalidades do agronegócio viram febre no mercado e atraem investidores de todos os portes 

Por Marco Damiani e César H. S. Rezende

Uma verdadeira febre tomou conta da Bolsa de Valores, e suas causas estão diretamente relacionadas ao crescimento do agronegócio. Atende pelo nome de Fiagro, os fundos de investimento nas cadeias produtivas agroindustriais. Criado oficialmente em março de 2021, em pouco mais de dois anos se multiplicou na forma de 35 opções de escolha para pessoas físicas e jurídicas. Em relação ao ano passado, o crescimento do volume de recursos amealhados cresceu 45%, dando um salto de R$ 6 bilhões para R$ 8,7 bilhões. 

Trata-se de um dinheiro que amplia as formas de captação de recursos privados pelo produtor rural, o que pode ocorrer na forma de integração de imóveis a esses fundos, incremento financeiro nas cadeias produtivas e participação direta em ações e títulos de empresas do setor rural. “O agro tem a necessidade permanente de financiamento, mas cresce a passos mais largos do que a oferta de crédito tradicional”, afirma Marielle Brugnari, gerente de Produtos de Commodities da Bolsa de Valores de São Paulo. “Os Fiagros criam uma linha direta entre o mercado de capitais e o agronegócio, proporcionando uma nova fonte de recursos.”  

Para os cotistas, os rendimentos vêm da valorização de imóveis rurais, recebíveis pela venda da produção, participação em sociedades de empresas rurais e pagamento de juros pelos tomadores. Entre janeiro do ano passado e junho deste ano, a participação de pessoas físicas nos Fiagros cresceu dez vezes, de 33 mil para 308,5 mil. Um dos principais motivos para a adesão em massa está no benefício tributário de isenção do Imposto de Renda. Outro ponto de atração é o rendimento.  

Tome-se como exemplo o FZDA11, administrado pela XP Investimentos e lançado em setembro do ano passado. Desde lá, rendeu 59,99% até junho deste ano. A sustentação do fundo está em terras adquiridas na região do Matopiba, uma extensão de cerrado que abrange os estados de Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia. O nome vem da junção dos fonemas iniciais de cada um deles. 

Ali, a atividade agrícola data do início dos anos 1980, mas há muito por explorar. “A região é propícia para a produção de soja, milho, algodão e madeira”, elenca Leandro Bortolon, pesquisador da Embrapa. Por meio de contratos de arrendamento indexados aos valores das commodities agrícolas, os administradores do fundo obtêm os recursos que remuneram os investidores. 

Especializado em vendas e arrendamentos de imóveis rurais, o corretor Woody Macedo, da ERC Fazendas, atua em oito estados a partir de seu escritório em José Bonifácio, na região de São José do Rio Preto, interior de São Paulo. Ele atesta que o valor das terras com capacidade produtiva não para de crescer. “Cinco anos atrás, um alqueire nesta região valia R$ 250 mil, mas hoje em dia não sai por menos de R$ 600 mil”, diz ele, que possui experiência de 15 anos no mercado. “Em regiões mais distantes, longe de cidades maiores e sem boas condições para o escoamento da produção agrícola, o alqueire que antes custava em torno de R$ 60 mil agora está em torno de R$ 150 mil.” 

Existem três modalidades de Fiagros no Brasil: o de direitos creditórios (Fiagro-FIDC), o imobiliário (Fiagro-FII), e em participações (Fiagro-Fip). No primeiro caso, os investidores adquirem recebíveis de vendas de produtos agrícolas ou pecuários. O segundo tipo é voltado para investimentos em terras rurais, o que permite que os investidores comprem cotas lastreadas em imóveis rurais. Por último, no Fiagro-Fip, os recursos são investidos em empresas do agronegócio, como agroindústrias e outros empreendimentos relacionados. 

No exterior, os fundos agrícolas são uma realidade há bastante tempo. Nos Estados Unidos, os Real Estate Investment Trusts (REITs) assemelham-se aos Fiagros imobiliários brasileiros, permitindo investimentos em propriedades e imóveis comerciais. No Canadá, os fundos de investimento em infraestrutura são uma modalidade popular de investimento voltada para infraestrutura pública, como portos, rodovias e ferrovias – boa parte dela é destinada a escoar a produção agrícola. Na Austrália, os fundos de investimento em commodities agrícolas são populares e investem em commodities agrícolas, como trigo, soja, milho e algodão. 

No Brasil, a maior parte dos Fiagros, em razão da valorização do preço da terra e do potencial de subir ainda mais, aplica os recursos do investidor em imóveis rurais. Pelas regras estabelecidas pelas autoridades, as pessoas físicas só podem ter acesso a esse modelo de fundos, já que os que atuam no apoio financeiro à cadeia produtiva do agro e os que compram participações societárias em empresas do setor são restritos a investidores profissionais ou qualificados, com mais de R$ 1 milhão para aplicar.

“Os Fiagros são uma revolução feita a muitas mãos”, define o deputado federal Arnaldo Jardim (Cidadania-SP), autor da lei que criou esses fundos. “Eles proporcionam instrumentos mais estáveis para o produtor, muitas vezes com taxas melhores do que as fontes tradicionais de crédito, como o financiamento bancário, e com absoluta segurança jurídica.” 

Na B3, a forte adesão aos Fiagros pelo público não causou surpresa. “Dada a importância do mercado do agronegócio, que representa quase um terço do PIB brasileiro, o crescimento já era esperado, mas o potencial ainda é enorme”, diz Marielle Brugnari, da B3. “Esse crescimento tem acontecido de maneira rápida, muito ligado às necessidades de financiamento por parte do setor agrícola, à própria expansão do mercado de capitais e ao crescimento da base de investidores em mercado de bolsa”, completa ela. Para o agronegócio, portanto, as boas notícias vindas dos Fiagros devem continuar surgindo.