SEMEADORA DE INOVAÇÃO

Por André Sollitto   Indicada para representar o Brasil na FAO, Paula Packer, chefe-geral da E


Edição 36 - 25.06.23

Por André Sollitto

 

Indicada para representar o Brasil na FAO, Paula Packer, chefe-geral da Embrapa Meio Ambiente, defende o uso irrestrito de novas tecnologias para o combate às mudanças climáticas

 

A Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura, a FAO, é conhecida principalmente pelas ações de combate à fome e à pobreza, mas atua também na busca de soluções sustentáveis para o agro. No início de março, a Parceria de Avaliação e Desempenho Ambiental da Pecuária (Livestock Environmental Assessment and Performance Partnership – Leap), iniciativa da entidade que pretende melhorar o desempenho ambiental das cadeias de abastecimento da pecuária, anunciou os grupos técnicos para a criação de diretrizes em áreas como bioeconomia circular e serviços ecossistêmicos. Foram escolhidas 72 pessoas de 28 países, e o Brasil será representado por cinco profissionais. Entre eles, está Ana Paula Contador Packer, chefe-geral da Embrapa Meio Ambiente e um dos principais nomes do País na área de pesquisas sobre mudanças climáticas e inovação no campo. 

 

A escolha da FAO não poderia ter sido mais certeira. Engenheira agrônoma formada pela Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq), Packer fez mestrado e doutorado em Química Analítica pelo Instituto de Química de São Carlos (IQSC) e participou de cinco programas de pós-doutorado. Passou ainda um ano como pesquisadora visitante no Health Canada, instituto federal que desenvolve iniciativas ligadas à área de saúde. “Esse momento de minha trajetória foi muito focado na química analítica e forneceu uma boa base quando entrei na Embrapa”, diz. “Saí um pouco do laboratório e entrei na seara das mudanças climáticas.” 

 

A nova posição a estimulou a ir a campo para estudar as emissões dentro das fazendas. Visitou produtores e associações setoriais e começou a construir uma base de dados “tropicalizados”, que incluem não apenas os índices de poluentes, mas uma série de outros indicadores que ajudam a mensurar os efeitos e as causas das mudanças climáticas. “Ao contrário da Europa, que tem uma rede de pesquisa muito robusta, no Brasil há grande necessidade de nacionalizar dados referentes a emissões e seus efeitos na produção agrícola”, afirma.  

 

Nesse contexto, a cientista passou a desenvolver, sob a coordenação do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação, um amplo inventário nacional a respeito dos gases do efeito estufa. O projeto foi sendo construído ao longo do tempo e passou a contar com a contribuição de outros ministérios e instituições. Por enquanto, o material registra apenas as emissões de poluentes, mas Packer lembra que o Brasil tem grande potencial para trabalhar com a mitigação dos efeitos nefastos das mudanças climáticas. 

 

Para combatê-las, contudo, é preciso, na fase imediatamente anterior, mensurá-las. “Muita gente diz que o agro brasileiro pode contribuir para a descarbonização das cadeias produtivas”, afirma. “Para isso, no entanto, é preciso ter índices, mapear e usar tecnologias de ponta.” Lembre-se de que o agronegócio é também uma vítima das mudanças do clima. Basta observar com atenção os eventos extremos recentes, como a seca no Sul e a vulnerabilidade crescente do semiárido. “Precisamos mostrar interna e externamente que a agricultura pode ser sustentável”, ressalta Packer.
 

O caminho rumo à sustentabilidade, não custa reforçar, passa por diversos fatores. Além do conhecimento técnico, está diretamente ligado à inovação – a boa notícia é que o Brasil se tornou nos últimos anos referência em novas tecnologias agrícolas. Packer é entusiasta do tema. Tanto é assim que estruturou um novo departamento voltado a esse segmento dentro da Embrapa Meio Ambiente. “Se você pensar que a atuação da unidade é transversal, inserir a inovação no meio foi algo realmente disruptivo”, diz. Hoje em dia, ela atua ao lado tanto de profissionais com décadas de experiência na Embrapa quanto de jovens empreendedores. A troca de conhecimento entre as gerações certamente levará a grandes mudanças no futuro. “O agro ainda é um pouco old-fashioned”, brinca. “No fim, o produtor quer saber se a tecnologia vai aumentar a produtividade e reduzir os custos.” 

 

Packer também lidera o AgNest, um hub de inovação que está sendo construído por meio de uma parceria público-privada entre a Embrapa, Banco do Brasil, Bayer, Jacto e Nutren. A ideia surgiu a partir de um projeto conjunto de duas unidades da Embrapa, as divisões de Meio Ambiente e Agricultura Digital. Após longo período de incubação, finalmente o espaço, um farm lab, como ficou conhecido, começou a tomar forma na cidade de Jaguariúna, no interior de São Paulo, dentro dos campos experimentais da Embrapa Meio Ambiente. Além da proximidade com universidades e instituições de pesquisa, terá espaços para que os empreendedores testem as novidades em situações mais próximas do dia a dia das fazendas. 

 

As posições de destaque que Packer assumiu nos últimos anos são ainda o retrato de uma profunda transformação: nunca as mulheres foram tão influentes em um setor tradicionalmente masculino. “A inclusão feminina no agro é uma tendência muito forte”, diz a chefe da Embrapa Meio Ambiente. “Cada vez mais vejo mulheres formadas em engenharia agronômica ou que comandam o dia a dia das fazendas.” Não há dúvida: com maior inclusão, certamente novas lideranças femininas surgirão nos próximos anos.