MÁQUINAS DE INOVAÇÃO

Por Paula Pacheco   Modernização do agro impulsiona mercado de equipamentos agrícolas  


Edição 36 - 15.05.23

Por Paula Pacheco

 

Modernização do agro impulsiona mercado de equipamentos agrícolas

 

A pujança do agronegócio brasileiro provocou nos últimos anos grandes transformações em diversos segmentos econômicos. Com a explosão da produção no campo, a indústria de transportes se modernizou, os fabricantes de insumos ampliaram seus investimentos e as empresas de tecnologia passaram a desenvolver inovações voltadas especificamente para dentro das porteiras. Tudo isso, contudo, é apenas uma fração do que o agro é capaz de fazer. Como não poderia deixar de ser, o dinamismo observado nas fazendas atingiu em cheio o setor de máquinas agrícolas. De um lado, o avanço do agronegócio estimula a indústria a criar equipamentos cada vez mais eficientes. De outro, as máquinas da nova geração impulsionam a produtividade das lavouras. É uma troca que beneficia produtores, empresas e, acima de tudo, o País. 
 
A indústria de máquinas e equipamentos agrícolas se tornou um celeiro de inovações. No ano passado, a John Deere, uma das maiores fabricantes do mundo, introduziu no mercado brasileiro a colhedora de grande porte CH950. Usada na cultura da cana-de-açúcar, ela possui duas linhas de cortes simultâneos e independentes, enquanto os modelos anteriores permitiam a colheita de apenas uma linha de cana por vez. De acordo com a empresa, uma das vantagens da CH950 é a diminuição da área compactada e das perdas totais na lavoura, além do menor consumo de combustível por tonelada de cana colhida.  
 
Para os produtores, a inovação, de fato, resultará no corte de despesas. Dados fornecidos pela multinacional americana indicam que a colhedora reduz em 22% o custo da tonelada de produção. Os números também apontam para uma queda de 36% na mão de obra de operadores de campo, 30% no consumo do diesel e 50% menos perdas – isso ocorre, diz a John Deere, porque a nova versão da máquina foi projetada justamente para otimizar a operação agrícola. 
 
Melhorar a produtividade das lavouras é o que move as inovações nessa área. A Fendt, principal marca de alta tecnologia em equipamentos agrícolas da americana AGCO, aposta em avanços voltados à agricultura de precisão. Recentemente, a empresa lançou a plantadeira de ultraprecisão Momentum, dotada de um sistema, o “Fendt Smart Frame”, que faz automaticamente o nivelamento dos suportes das linhas. Isso permite, assegura a fabricante, adequação a qualquer condição de terreno. O interessante é que a máquina foi projetada e produzida no Brasil – o que dá a dimensão da força do mercado nacional.  
 
O avanço da produção agrícola brasileira não apenas estimula multinacionais a desenvolver produtos voltados especificamente para as lavouras do País, mas impulsiona a própria indústria nacional. Criada pelos irmãos Henrique e Mateus Belei, tradicionais produtores de cana-de-açúcar de Lençóis Paulista, no interior de São Paulo, a Grunner é fruto de uma grande inovação. Para eliminar o pisoteio nas linhas de cana – neste processo, o trator literalmente amassa o solo –, eles adaptaram caminhões para a operação de colheita e aplicação de insumos. 
 
Os veículos possuem tecnologia de georreferenciamento e direção autônoma, além de bitolas ajustáveis que preservam as linhas da plantação. Diversos indicadores demonstram que os caminhões Grunner contribuem para a redução de custos. Na comparação com os tratores convencionais, os equipamentos da empresa diminuem de 15 a 20% o tamanho das frotas. Ou seja, se uma lavoura precisa de 20 tratores para realizar as suas atividades, ela poderá substituí-los por 16 Grunners que farão o mesmo trabalho. Além disso, o custo de manutenção de um trator utilizado na operação de transbordo é, em média, 40% menor que o de um modelo convencional. 
 
O setor de máquinas evolui em todas as suas frentes de negócios. Gerente de negócios da Jacto, Rodrigo Madeira explica que, para algumas funções, os equipamentos vêm crescendo de tamanho em decorrência do aumento da capacidade produtiva nas fazendas. O executivo cita o exemplo dos pulverizadores. No início, eram tanques acoplados às costas de quem ia fazer a aplicação de produtos. Com a evolução, foram agregados ao processo tratores com carretas de mil, 2 mil e, atualmente, até 4,5 mil litros. 
 
Outra mudança recente no segmento é a velocidade dos veículos, que chegam agora a alcançar 35 km/h. Como pontua o executivo, as máquinas do agro tiveram de ficar mais rápidas e precisas para acompanhar a nova realidade do agronegócio brasileiro. “Esse é o tipo de característica importante, já que é preciso aproveitar as janelas de trabalho no campo, cada vez mais afetadas pelas mudanças climáticas”, afirma Madeira. “Em um pós-chuva, quando o sol começa a sair, o equipamento já deve estar preparado para uso. Quanto maior a capacidade, maior o aproveitamento feito naquele espaço de tempo.” 
 
Lançado no ano passado, o pulverizador Arbus 4000 JAV é um modelo autônomo usado na citricultura. Sem operador na cabine, o veículo recebe as orientações remotamente. O gestor da propriedade tem acesso a um mapa online do trabalho executado pela máquina e pode alterar a programação sempre que necessário. Segundo o executivo da Jacto, veículos desse tipo aumentam a produtividade e a assertividade na aplicação dos produtos. 
 
Os pulverizadores que trabalham com operadores também buscam combinar essas características, o que se deve à tecnologia embarcada. Com a ajuda de GPS e outros softwares avançados, eles não fazem a sobreposição na hora de aplicar os produtos, como exemplifica Madeira. Antes, as aplicações ocorriam em intervalos de oito partes (seções). Hoje em dia, chegam a 100 partes. De acordo com a Jacto, o processo faz com que o agricultor economize algo como 10% do volume do produto que seria aplicado pelos métodos tradicionais. 

 
No cada vez mais competitivo mercado agrícola internacional, encontrar formas de aumentar a produtividade e reduzir custos se tornou vital para a própria viabilidade do negócio. Por isso, as fabricantes de máquinas têm ampliado os investimentos em inovação. A agricultura de precisão, também conhecida como tecnologia 4.0, está inserida nesse contexto. 
 
Em linhas gerais, ela faz com que os produtores utilizem menos insumos e extraiam o máximo da operação agrícola. Para ficar mais claro: com a ajuda de sistemas especializados, o agricultor tem maior controle de seus insumos e evita gastos excessivos com irrigação e fertilizantes. Além do aspecto econômico, a agricultura de precisão também é forte aliada do meio ambiente, na medida em que estimula a distribuição racional de insumos e recursos hídricos. 
 
Trata-se de um segmento em expansão. Segunda maior fabricante de equipamentos agrícolas do mundo, a italiana CNH Industrial – dona de marcas como CaseeNew Holland e com fábricas no Brasilespera chegar, em 2023, a seu primeiro US$ 1 bilhão em receitas geradas pela tecnologia de precisão. Para efeito de comparação, em 2022 o valor foi de US$ 900 milhões. 
 
No final do ano passado, o conglomerado anunciou o lançamento de seu primeiro protótipo de trator elétrico com direção autônoma. Desenvolvido em parceria com uma startup da Califórnia, nos Estados Unidos, o trator T4 Electric Power tem pequeno porte e motor de 120 cavalos 90% mais silencioso do que concorrentes do mesmo tamanho. Parece uma vantagem apenas relativa, mas em fazendas de gado isso pode ser fundamental para reduzir o nível de estresse dos animais. A expectativa da empresa é de que o T4 elétrico comece a ser produzido comercialmente no segundo semestre do ano, devendo chegar ao mercado brasileiro a partir de 2024. 
 
Até pouco tempo atrás, as grandes fabricantes do setor focavam os investimentos em máquinas dotadas de motores com alta potência. Hoje em dia, contudo, o que faz diferença é a tecnologia embarcada, como softwares de automação, precisão e coleta de dados. Não à toa, a CNH Industrial tem prospectado oportunidades no mercado. Em 2021, por exemplo, pagou US$ 2,1 bilhões pela americana Raven Industries, uma das líderes mundiais em agricultura de precisão. Investidas como essa fazem todo o sentido. Como não existem mais muitas áreas plantáveis no mundo, o único caminho é aumentar a produtividade das fazendas – nesse contexto, ressalve-se, a tecnologia exerce papel fundamental. 
 
No Brasil, a taxa básica de juros em 13,75%, o patamar mais alto desde o final de 2016, adiou os planos de muitos produtores rurais que planejavam fazer aquisições para as próximas safras. No ano passado, o faturamento da indústria de máquinas e equipamentos agrícolas foi de R$ 90,6 bilhões. Para 2023, dados preliminares apontam para uma retração entre 5 e 10%, segundo estimativas de Pedro Estevão Bastos de Oliveira, presidente da Câmara Setorial de Máquinas e Implementos Agrícolas (CSMIA) e vice-presidente da Associação Brasileira do Agronegócio (Abag). 
 
A expectativa é de que haja uma recuperação nas encomendas de máquinas e equipamentos com o lançamento do Plano Safra, que libera financiamentos para o setor. Mesmo assim, o ano ainda tende a terminar com números mais acanhados do que os vistos em 2022. “Nesse contexto, o produtor prefere engavetar projetos de aquisição e reformar a máquina da qual já dispõe ou comprar no mercado de usados”, afirma Oliveira.  
 
Como o agronegócio não pode parar, o produtor recorre ao mercado de usados nas situações em que é mais difícil adquirir máquinas novas. Empresa do Grupo Simpar, a Vamos, que atua na locação de máquinas e equipamentos, tem no agronegócio 30% de seu faturamento – e a participação só aumenta. O Centro-Oeste é peça importante na engrenagem de crescimento da locadora e prestadora de serviços. Em 2022, a Vamos incluiu na frota cerca de 2 mil conjuntos como os rodocaçambas, usados para escoar a safra de grãos da região. 
 
A Vamos não divulga a projeção de desempenho para este ano, mas seu CEO, Gustavo Couto, demonstrou otimismo na divulgação dos resultados da empresa, em março. “O agronegócio brasileiro vive um momento de crescimento intenso e contínuo, que se reflete no aumento da demanda por caminhões e máquinas agrícolas”, disse na ocasião. “Nesse cenário, há um horizonte de oportunidades para a Vamos, que tem expandido sua atuação no setor. Hoje, temos mais de 4 mil ativos locados para o agronegócio na região Centro-Oeste.” 
 
Dados do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV-Ibre) reforçam a expectativa de executivos como Couto. O PIB do agronegócio deverá acelerar 8% em 2023. Caso o número se confirme, significará o maior salto desde 2017, o que obviamente movimentará toda a cadeia – da venda de fertilizantes ao segmento de máquinas e equipamentos, mesmo que seja o de locação e de usados. “O bom momento do agronegócio estimula a tendência da locação, especialmente no Centro-Oeste, onde os produtores estão cada vez mais capitalizados”, afirmou Couto. 
 
De fato, o segmento de usados tem acelerado nos últimos anos. Mauricio Pereira, diretor comercial da Armac, observa o movimento há pelo menos cinco anos, mesmo quando a Selic ainda estava em patamar mais baixo. Nos últimos meses, tem havido um aquecimento ainda maior. “O acesso ao crédito é hoje um desafio para todos e por isso muitos começam a revisar a tomada de capital”, afirma. 
 
Atualmente, a empresa possui uma frota agrícola formada por 1,7 mil veículos, incluindo caminhões de apoio. Cerca de 60% dos contratos no setor de agro envolvem não apenas os veículos, mas também a prestação de serviços de manutenção. O executivo da Armac enxerga espaço para mais crescimento. No Brasil, as locações respondem por 25% dos negócios totais do setor. Nos Estados Unidos, o índice é de aproximadamente 50%. O agronegócio brasileiro certamente seguirá crescendo em ritmo veloz nos próximos anos, o que trará inúmeras oportunidades para os protagonistas do setor de máquinas e equipamentos agrícolas. Portanto, é hora de colocar o no acelerador.