Edição 29 - 09.05.22
Terra da Uva, Cidade do Tomate, Capital Mundial do Zebu e muitos outros títulos distinguem municípios recordistas na produção agropecuária, dinamizam as economias regionais e fazem com que eles desfrutem do carinho popular.
Enraizada nos costumes e positiva para os negócios, uma das mais belas tradições do campo brasileiro atravessa gerações sem perder o charme e a popularidade. Distinguidos pelo histórico, pela produtividade e pela identificação de suas populações com culturas específicas do agronegócio, dezenas de municípios rurais do País exibem, com orgulho e satisfação, títulos reconhecidos de “campeão brasileiro”, “capital mundial” e “terra” de produtos que vão da soja ao boi zebu, do milho à cevada, passando pela uva, tomate, morango, mel e tantos outros.
Concedidos por órgãos formais como o Congresso Nacional, chancelados pelo IBGE e, especialmente, lembrados com carinho por milhões de brasileiros, esses galardões não apenas enchem de orgulho as populações locais, como servem de estímulo para a atividade econômica e o setor de turismo. Viajar pelas capitais do agro permite conhecer e entender o histórico da produção rural no Brasil e o impacto real da agropecuária no desenvolvimento do interior do País. Nas próximas páginas, fazemos um tour por algumas delas. Acompanhe:
CAXIAS DO SUL, A TERRA DA UVA
Quem não sabe, por exemplo, qual é e onde fica a Terra da Uva? Orgulhosa de obter esse reconhecimento popular há mais de um século, Caxias do Sul, município de destacada economia agroindustrial na serra gaúcha, é sem dúvida um dos maiores exemplos de cidade presente há muito tempo no imaginário de milhões de brasileiros. A forte imigração italiana, que plantou as primeiras mudas de parreiras nos arredores da cidade no final do século 19, acrescida das conquistas e do crescimento ao longo do tempo garantem a preservação de antigas tradições, com amplos ganhos econômicos.
Em Caxias, a Festa Nacional da Uva e do Vinho é realizada anualmente desde a década de 1930, sempre com a presença das maiores autoridades do País, entre as quais presidentes da República, e a participação de milhares de pessoas. Háexatos 50 anos, em 1972, por exemplo, o então presidente Emílio Médici, um gaúcho, movimentou sua equipe para que a primeira transmissão de TV a cores feita no País ocorresse diretamente do evento, organizado em torno de centenas de produtores da região – e, é claro, com a sua presença.
Para este 2022, depois de dois anos sem participação presencial, em razão da pandemia do coronavírus, Caxias volta a abrir seu grandioso parque de exposições, com três pavilhões incrustados em 35 hectares, para celebrar sua cultura agrícola mais importante. Marcada para acontecer entre 18 de fevereiro e 6 de março, a festa completará 90 anos.
“Vamos distribuir mais de 200 toneladas de uvas, trazidas por mais de mil produtores de Caxias e região, para as mais de 800 mil pessoas que deverão estar conosco durante os 15 dias de festa”, comemora o presidente do evento, Fernando Bertotto. A celebração cria mil empregos diretos em sua organização, enquanto toda a direção exerce trabalho voluntário. Potências da indústria local, e orgulho do setor fabril nacional, como a Marco Polo, fabricante de ônibus de padrão internacional, e a Randon, de carrocerias, irão expor seus últimos lançamentos como patrocinadoras da elegia à uva.
Apenas para o comércio e a hotelaria da cidade, estima-se que os milhares de visitantes do evento deixarão R$ 250 milhões em dinheiro novo. Para a região, que forma a famosa Serra Gaúcha, a injeção de recursos promovida pela festa pode chegar a R$ 800 milhões. Sem dúvida, ser reconhecida como a Terra da Uva, com destaque para a alta qualidade do produto, é um ótimo negócio para Caxias. Viva a uva!
UBERABA, A CAPITAL MUNDIAL DO ZEBU
Nos últimos cem anos, o município de Uberaba teve um foco: o desenvolvimento de uma raça de gado tipicamente brasileira. Deu tão certo que, nas últimas décadas, esta rica cidade pertencente ao Triângulo Mineiro passou a ser reconhecida globalmente como a Capital Mundial do Zebu. Uma visita ao seu entorno leva à compreensão imediata deste título. Cercada por grandes fazendas, produtoras de gado de corte, de leite e de melhoria genética de animais, quase toda a economia do município gira em torno do boi. “O município se tornou um ponto de encontro global de quem promove a pecuária zebuína”, comemora o presidente de uma das entidades mais fortes do agronegócio nacional, a Associação Brasileira dos Criadores de Zebu (ABCZ), Rivaldo Machado Borges Júnior. “Nos acostumamos a receber comitivas de todos os continentes, que vêm em busca de nossos exemplares e da nossa tecnologia de melhoramento genético”, completa ele. Em razão dos negócios realizados durante todo o ano, Uberaba está entre as cinco maiores economias de Minas Gerais, com um PIB superior a R$ 15 bilhões.
Este ano, a concorrida ExpoZebu voltará a ser presencial e vai ocorrer a partir do mês de abril. No Parque Nacional do Zebu, exposições, premiações e leilões milionários devem reunir, em duas semanas de evento, mais de 500 mil pessoas, entre as quais a elite de criadores de gado do País e do mundo. “Uberaba tem uma grande e importante característica, que é a sua localização geográfica”, explica Borges Júnior. “Estamos há alguns quilômetros dos principais centros comerciais e políticos do País, como também de aeroportos internacionais e portos, o que facilita o contato e acesso de criadores de qualquer parte.” Nos últimos 25 anos, as cerca de 800 fazendas de gado do município registraram mais de 400 mil nascimentos de zebuínos. A previsão da ExpoZebu é a de movimentar diretamente mais de R$ 50 milhões em negócios, com igual volume de recursos injetado na economia da cidade no circuito de hotéis, lojas e restaurantes. Êêê, boi!
GUARAPUAVA, A CAMPEÃ NACIONAL DA CEVADA
A imigração eslavo-germânica ocorrida na década de 1940, após o final da Segunda Guerra Mundial, deitou raízes por todo o interior do Paraná, mas foi em Guarapuava que as primeiras famílias vindas da Europa plantaram o que hoje é a maior riqueza da região, a cevada. Trata-se, como todos sabemos, da preciosa matéria-prima do malte usado na fabricação de cerveja. O histórico cultivo faz com que o município seja reconhecido pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) como o maior produtor da cultura do País, tornando Guarapuava a “Capital Nacional da Cevada”.
Os números impressionam. O Paraná respondeu por quase 62% da área cultivada e por 72% da produção do grão de cevada no Brasil, batendo recorde na colheita realizada em dezembro de 2021. E Guarapuava puxou esse desempenho, com 65% do volume total da produção estadual, por meio do cultivo de 45,5 mil hectares. No total, a safra atual rendeu a fábula de 279 mil toneladas do grão, contra 206 mil toneladas na colheita anterior. Considerada a maior malteria do País, a Agrária Malte, no distrito de Entre Rios, é responsável por atender 30% da demanda nacional.
“Guarapuava é uma verdadeira potência na agropecuária, e na cevada em especial, com cada vez mais pesquisas e investimento em tecnologia”, assinala o prefeito Celso Góes. “Temos orgulho de ter o reconhecimento de ‘Capital Nacional da Cevada e do Malte’. Nossa cadeia produtiva contempla desde a matéria-prima até o produto final. O polo cervejeiro local fomenta o turismo e a economia de maneira muito assertiva”, acrescenta o executivo público. Um brinde!
PATY DO ALFERES, A CIDADE DO TOMATE
Na serra fluminense, a simpática Paty do Alferes, de cerca de 28 mil habitantes, tem dentro de si uma riqueza vermelha e delicada como um coração. É o tomate que domina a lavoura de mais de 500 pequenos e médios proprietários rurais da região. Eles abriram mão da cultura do café, na década de 1990, e passaram a investir num produto com baixo teor de agroquímicos e alto valor agregado. O resultado, nos últimos anos, quando os cultivos passaram a ser feitos em estufas, é um patrimônio atual de 50 mil pés de tomate, que atendem todo o mercado do Rio de Janeiro e parte da demanda nacional.
Sede da Seal Hortifruti Associados, Paty do Alferes se orgulha de realizar, anualmente, a Festa do Tomate, com o melhor da sua produção. A grande maioria dos produtores tem seu desenvolvimento rastreado, de modo que sejam preservados os mais rigorosos princípios de sustentabilidade ambiental. A grande festa ocorre na época do feriado de Corpus Christi e chega a atrair, durante a semana de realização, mais de 50 mil pessoas por dia, quando shows com artistas famosos nacionalmente se revezam entre concursos para o melhor fruto e os melhores pratos. “É uma festa tipicamente de roça, que junta toda a comunidade para celebrar nossa maior riqueza”, define a engenheira agrícola Mariana Otero Nogueira, ligada à prefeitura da cidade. Ela conta que seguidas administrações do município investiram no modelo conhecido como economia circular, no qual os recursos gerados pelos produtores locais são reinvestidos na própria região. Todas as semanas, Mariana é responsável pela feira que vende produtos hortifrutigranjeiros de primeiríssima qualidade, obtidos pelo sistema de agricultura familiar, atraindo para a cidade um grande público regional. “Paty do Alferes soube se reinventar, com nossos produtores, apoiados pela Prefeitura Municipal e pela Emater, sempre investindo e lucrando com um tomate e outros mini frutos, como pimentão, abóbora e pimenta de alta categoria.” À mesa, pois!
ESPÍRITO SANTO DO PINHAL, O BERÇO DO CAFÉ
Num estado famoso pela secular cultura cafeeira, ser reconhecida como a Capital Estadual do Café é um feito bastante especial. Assim é em São Paulo, com Espírito Santo do Pinhal, a cidade fundada por imigrantes italianos em 1849. Desde lá, o café está no centro da atividade econômica, com sua riqueza traduzida em uma série de palácios e monumentos erguidos nas épocas de ouro. O Museu do Café é um dos maiores orgulhos do município, com vasta documentação sobre o grande produto brasileiro. No passado, a cidade foi um importante centro de comercialização, e hoje se destaca pela produção que aposta na alta qualidade dos cafés especiais.
Com 9 mil mudas representativas de todas as qualidades de café plantadas no município ao longo de sua história, a Fazenda Retiro Santo Antônio, pertencente ao engenheiro Jefferson Adorno, prima pela responsabilidade ambiental. De sua área de 123 hectares, 33 são destinados à produção de café e outros 35 ficam preservados. Com a marca prime Kaynã, Adorno conquistou em 2019 o título de Cafeicultor Destaque do Brasil. “Plantamos com amor à natureza, abrindo corredores ecológicos interligando nascentes e atraindo, assim, animais silvestres da região”, explica o reconhecido produtor. Eita cafezinho bom esse, sinhô!
Além das cidades citadas, muitas outras Brasil afora têm suas próprias marcas únicas e singulares. Como ponto em comum, todas elas conseguem manter uma atividade econômica diversificada a partir da forte raiz no agronegócio. É assim que, na região Norte, a capital do Pará, Belém, foi agraciada recentemente, em projeto aprovado pelo Congresso Nacional, com o título de Capital Nacional do Açaí. Em Alagoas, o município de Arapiraca está reinventando a sua economia a partir da cultura fumageira e já ostenta o título de “Capital do Fumo no Nordeste”. Em Minas Gerais, Patos de Minas mantém há tempos o título de Terra do Leite, por sua grande produtividade neste quesito. E não há como não lembrar de Sorriso, em Mato Grosso, no coração do Centro-Oeste, a Capital Mundial do Agronegócio, com a maior produtividade de soja do mundo.
Como se vê, municípios campeões do agronegócio é o que o Brasil, ainda bem, mais tem!