Filhos pródigos

Por Felipe Porciúncula O diálogo nem sempre é pacífico. Os conflitos de geração, inevitáveis.


Edição 21 - 11.09.20

Por Felipe Porciúncula

O diálogo nem sempre é pacífico. Os conflitos de geração, inevitáveis. Com o equilíbrio certo entre tradição e inovação, entretanto, cada vez mais jovens herdeiros têm conseguido ampliar o horizonte dos negócios rurais de sua família. Quando assumem postos de comando, divergir dos pais não é fato raro. Assim como não é incomum que, com o espírito e ideias renovados, tragam ganhos de rentabilidade. “É importante que o filho agregue novos valores para que o patriarca não o veja apenas como a sua continuidade. Quem está chegando precisa complementar a operação da fazenda antes de ser o sucessor. Ao sentir que o futuro dono conhece de gestão, o antigo dono sente firmeza em passar o bastão”, analisa Denis Arroyo Alves, sócio da consultoria Markestrat Group.

                            Caminhão desenvolvido pela Grunner Tec para trabalho na lavoura de cana

Em vários segmentos é possível ver avanços quando a tecnologia é aliada à experiência, criando até novos nichos. Esse foi o caso de Mateus Belei, que, juntamente com o irmão Henrique, assumiu, em 2011, a empresa agrícola Agro Cana Caiana. Para aumentar a produtividade, mudaram o sistema agrícola ao perceber que boa parte do ganho ia por terra em função de práticas equivocadas no manejo da produção. “Na hora de plantar acontecia muito pisoteio no solo, o que reduzia o potencial de crescimento. Começamos a estudar as opções tecnológicas disponíveis e chegamos a um modelo de adaptação do caminhão, mais apropriado que o trator, para fazer o plantio”, conta Mateus (leia quadro no final desta reportagem).

Mateus Belei, da Grunner Tec: solução caseira para lavoura gerou negócio e parceria com a Mercedes-Benz

Como notícia boa se espalha rápido, outros produtores (inicialmente de cana) começaram a se interessar pela novidade. O resultado é que, logo no primeiro ano, foram solicitados a adaptar veículos de terceiros. A inovação deu origem a uma empresa de tecnologia para o agronegócio, a Grunner Tec, especializada na produção de caminhões equipados com direção autônoma, georreferenciamento e bitolas ajustadas para eficaz controle de tráfego nas lavouras. O bom desempenho dos veículos adaptados – que substituíram, com vantagens, tratores mais pesados no trabalho de transporte da cana durante a colheita – atraiu a atenção da Mercedes-Benz, que firmou parceria de exclusividade com a Grunner para aportar a tecnologia em caminhões da marca. Em 2019, a associação resultou em 50 caminhões adaptados. Para 2020, a meta é chegar aos 120 – entregues com garantia de assistência técnica da grife alemã, além do financiamento do Banco Mercedes-Benz.

“Estamos presentes em quatro estados e com um potencial de crescimento até para fora do Brasil”, diz Mateus. “Queremos ir com calma para conseguir atender com qualidade toda a demanda do mercado, que, além do segmento da cana, já abrange vários setores agrícolas.” O jovem segue, assim, a trilha aberta pelo pai, José Armando Belei, que ainda jovem transportava trabalhadores para as lavouras da região de Lençóis Paulista, no centro-oeste de São Paulo. Em seguida, Belei começou a carregar cana para as usinas. Iniciou operando com um caminhão, passou a contratar veículos de terceiros e estabeleceu uma pequena frota de prestação de serviços no transporte de cana. Em 2003, novo desafio mudou o rumo de seus negócios: recebeu o convite para se tornar um produtor de cana, em terras arrendadas pelo grupo Zilor, no sistema de parceria agrícola. No princípio dessa nova etapa cultivava cerca de 1,2 mil hectares. Hoje a Agro Cana Caiana planta 5 mil hectares de cana.

                            Os queijos da marca Pardinho

DA CARNE AO QUEIJO

Bento Mineiro seguiu roteiro semelhante, mas no universo da pecuária. Filho de Jovelino Mineiro, dono da Fazendas Sant’Anna, uma grife na genética das raças Nelore, Brahman e Gir Leiteiro, ele está à frente dos negócios desde 2014, também ao lado do irmão. A empresa tem tradição em investimento em criação de animais a partir de um pacote tecnológico que inclui genética, manejo, pastagem e sanidade animal. O rapaz deu um novo tempero a essa fórmula. “Para atrair a atenção dos fazendeiros para nossa genética Gir, que já era comercializada pelo meu pai, resolvemos realizar um velho sonho: fazer queijos sofisticados com o leite cru”, conta Bento. “Para a nossa surpresa, o que seria uma vitrine virou um grande negócio.”

As lições que recebeu de Jovelino foram aplicadas na produção de queijo. Ao pesquisar a fundo as características do leite do Gir, Bento descobriu que tinham um “ouro em pó”. Por sua riqueza, era possível produzir um queijo mais sofisticado, a partir de técnicas desenvolvidas na França. A prova é que a marca da família, a Pardinho, gerou iguarias como os queijos Cuesta, Cuesta Azul e Mandala, que já ganharam prêmios internacionais como o Mondial du Fromage, realizado em Tours, na França – o Cuesta levou Super Ouro e o Mandala, Prata. O negócio cresceu tanto que hoje é distribuído em lojas especializadas e supermercados.

Bento Mineiro e seus queijos

“A paixão do meu pai pela pecuária resultou em um foco especial no segmento e trouxe contribuições estruturais, sobretudo em proporcionar uma liberdade na disponibilização de genética bovina, sempre visando propiciar soluções para a produção de carne nos trópicos. O perfil inovador nos negócios, aliado a uma visão de mundo singular e capacidade de executar projetos à frente de seu tempo, é a marca da atuação de meu pai e fruto de muito orgulho e constante aprendizado por mim”, lembra Bento.

Pensando em suprir a demanda da pecuária dos trópicos, a meta do grupo agora é expandir para a produção de embriões prontos para serem fecundados, voltados ao mercado internacional, através da empresa Zebuembryo, com sede em Uberaba (MG). “A proposta é que, assim como o Brasil é o líder em carne bovina no mundo, possamos consolidar uma marca de ponta na tecnologia de reprodução de gado”, diz.

UM BRINDE À SUCESSÃO

É de Minas também que vem um outro exemplo de excelência que combina perfeitamente com os queijos Pardinho. Trata-se do Vinho Maria Maria, batizado em homenagem a uma canção de Milton Nascimento e produzido perto da Serra da Mantiqueira, no sul do estado. “Tudo começou quando tive um enfarte e precisei mudar de vida. Um dos conselhos do médico foi começar a tomar vinho. E falei, por que não?”, lembra Eduardo Junqueira Jr., da quinta geração de uma família de cafeicultores da Fazenda Capetinga, em Três Pontas – cidade onde nasceu o compositor.

A família já produzia café arábica há muitos anos em sua propriedade. A diversificação começou com o pai, Eduardo Junqueira Nogueira, que introduziu a produção de leite na fazenda e chegou a ter uma vaca holandesa recordista sul-americana de produção leiteira, com mais de 60 litros por dia. Depois, com o objetivo de melhorar a produção do gado, introduziu o milho para a silagem.

Os Eduardos, duas gerações da família Junqueira

Foi apenas mais recentemente que Eduardo Jr. passou a aproveitar as suas viagens à Europa, onde participava de feiras internacionais de café, para conhecer vinícolas importantes. “A história clareou quando encontrei o estudioso Murilo de Albuquerque Regina, com pós-doutorado em Bordeaux, na França. Ele tinha pensado um sistema de plantio adequado ao clima do sul de Minas, muito semelhante a algumas regiões produtoras de vinho da Europa.

Em 2009, depois de muitas conversas, foram plantadas 20 mil mudas de espécies vitivinícolas na Capetinga. “O segredo está na dupla poda, que é feita duas vezes por ano, e na colheita, que acontece no período seco, em julho e agosto, para aproveitar os dias longos ensolarados e as noites frias. Dessa forma, conseguimos extrair uma uva de melhor qualidade”, explica o produtor, amigo de infância do compositor homenageado em seus rótulos.

A chegada da sexta geração aos negócios trouxe uma outra novidade para a fazenda: sofisticou o modo sustentável de produzir. Recém-formado em agronomia na Universidade Federal de Lavras (MG), Eduardo Junqueira Neto, além de ser responsável pela degustação dos vinhos, implantou a adubação biológica, hoje toda produzida na própria fazenda, além de gerenciar a gestão de energia fotovoltaica. “Aqui tudo só melhora e mesmo na pandemia não paramos a produção. Como no campo há pouca circulação de gente, o que sentimos foi na venda de alface americana, mas no resto está tudo normal. E os vinhos ficam até melhores”, lembra Eduardo Junqueira, que agora tem uma saúde de ferro.

RAÍZES QUE LEVAM LONGE

Foi também com o pai, Roberto Shiniti Sako, que o jovem agrônomo Henry Sako aprendeu a observar as plantas. “Nos anos 2000, meu pai manejou campos de batata com raízes de até 1,2 metro de profundidade, o que melhorou bastante a produção”, conta Henry. “A maior lição que ele deixou foi observar o plantio com inteligência e precisão”, lembra Henry.

Henry Sako, da DataFarm: tecnologia de olho na raiz

As lições continuaram na Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz” (Esalq/USP), onde o jovem aprofundou seus conhecimentos sobre como o correto enraizamento pode aumentar a produtividade das culturas. “A raiz é o seguro do produtor”, afirma Henry. “Muitas vezes temos lavouras com tratamento semelhante na parte aérea, mas com grande diferença de produtividade, apesar de estarem na mesma região. A origem dessa diferença está no solo e nas raízes.”

A combinação de enraizamento com outros fatores com o objetivo de buscar altas produtividades estão no DNA do negócio que o engenheiro agrônomo criou há três anos. Desde 2014, quando recebeu um convite do Comitê Estratégico Soja Brasil (Cesb), ele passou a aplicar suas técnicas de manejo de solos em lavouras do grão. O objetivo inicial era fazer as produtividades médias saltarem de 60 para 90 sacas por hectare.

“É importante entender que a raiz da soja pode chegar a até 3 metros de profundidade e nossos solos precisam ter sua fertilidade corrigida para as raízes poderem explorar esse perfil de solo”, explica Henry. “Calcário de boa qualidade, dose certa, uma adubação adequada e equilibrada, associação de plantas de cobertura  propiciam a construção da matéria orgânica, o que permite melhorar a infiltração e retenção de cada gota de água que o solo recebe, e isso vai possibilitar que, para cada gota de água, gere ao final maiores produções de grãos.”

Em 2017, Henry levou seu conhecimento para o campo digital, fundando a DataFarm, uma plataforma de inteligência agronômica que auxilia no planejamento e na tomada das melhores decisões para levar alta performance às lavouras. Hoje ele e os sócios atendem mais de 700 mil hectares – a maioria de soja e milho – em vários estados brasileiros, no Paraguai e em alguns países da África. Prova de que ouvir os ensinamentos do pai pode levar bem longe.

TRANSPORTE COM ECONOMIA

Os caminhões georreferenciados, com direção autônoma e adequação de bitolas, substituem com vantagem os tratores na colheita e aplicação de insumos. Mais leves e ágeis, têm menor custo de operação e maior produtividade.

Segundo a Grunner, os veículos são adequados para os setores canavieiro, de grãos, florestal e também para a mineração. A empresa, cuja montadora em Lençóis Paulista foi implantada há um ano, produz três modelos de equipamentos: a série ATR, para transbordo de cana na operação de colheita, e as séries ASP e ADS, para aplicação de insumos líquidos e sólidos, respectivamente.

As bitolas mais largas do Grunner|MB são adaptadas ao espaçamento da lavoura, preservando a área do canteiro de plantio. Na operação de transbordo de cana, o consumo de combustível do Grunner|MB em litros por tonelada de cana colhida é, em média, 37% menor em comparação ao trator operando nas mesmas condições de transbordo.

Com o tráfego controlado, que evita o pisoteio da linha de cana, o ganho de produtividade é de 21%, em média, segundo a Grunner. Com a maior produtividade, aumenta-se a longevidade do canavial em pelo menos um ano por ciclo, ou seja, de cinco para seis cortes. O custo de manutenção de um trator utilizado na operação de transbordo é, em média, de R$ 25mil/ano. O custo do Grunner|MB, na mesma operação, é de R$ 15mil/ano, ou seja, 40% menor. Uma usina de tamanho médio, com moagem de 3,5 milhões de toneladas de cana por safra, que utilize equipamentos Grunner|MB em sua frota de transbordo, obtém ao longo do ciclo de seis anos do canavial uma economia de R$ 21 milhões.

OS PRÊMIOS DOS VINHOS MARIA MARIA

  • Bel Sauvignon Blanc 2015 – Bronze Decanter 2017
  • Bia Syrah 2015 – Melhor Vinho Tinto Vini Bra Expo 2017
  • Diva Sauvignon Blanc 2016 – Recomendação Interntional Wine Challenge 2018 e Ouro Brazil Wine Challenge 2018
  • Diana Syrah 2017 – Prata Decanter 2019; Ouro Wine of Brazil Awards 2019; Vinho Revelação Guia Adega Vinhos do Brasil 2019/2020 90 pontos; 89 pontos GPVB 2019
  • Elis Sauvignon Blanc 2018 – Bronze Decanter 2019; Ouro Wine of Brazil Awards 2019; 89 pontos Guia Adega 2019/2020; 89 pontos GPVB 2019
  • Cristina Syrah 2016 – Recomendação Decanter 2019; Ouro Wine of Brazil Awards 2019 91 pontos; Ouro Grande Prova Vinhos do Brasil 2019
  • Sous Les Scaliers – Prata Decanter 2019; Gran Ouro Wine of Brazil Awards 2019; Ouro XI Concurso do Espumante Brasileiro; 88 pontos Guia Adega 2019/2020; 89 pontos GPVB 2019

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