19.07.18
Diferentes setores do agronegócio enfrentam, neste momento, discussões regulatórias que podem inviabilizar atividades ou na melhor das hipóteses, deixar as coisas muito mais difíceis no campo dos negócios. Vamos aos exemplos. Em São Paulo, a Assembleia Legislativa do Estado, a Alesp, se tornou arena de batalha em mais uma disputa entre ambientalistas e produtores no anunciado caso da proibição de exportação de gado vivo.
Para quem não acompanha o caso está para ser aprovado um projeto que proíbe o embarque de animais vivos para outros países sob a alegação de que a atividade fere o bem estar animal O projeto é de autoria do deputado Feliciano Filho, o mesmo que criou a lei Segunda sem carne, que no início do ano tentou proibir estabelecimentos públicos de servir o produto às segundas-feiras como forma de “conscientização dos risco do consumo de carne”. Apesar de ter sido aprovado em plenário, o projeto foi vetado pelo ex-governador Governador Geraldo Alkimin, mas a batalha consumiu tempo e energia de todo um setor. O governador Marcio França, contudo, disse apoiar o pleito ambientalista.
No Congresso Nacional, a Lei do Alimento Mais seguro, apelidada de Pacote do Veneno, também trouxe discussões acaloradas com direito até à colocação de uma bomba falsa na comissão que analisava o caso. Em Brasília, um mandado de segurança garantiu à Associação Brasileira da Indústria de Alimentos (Abia) mais prazo para enviar contribuições à Tomada Pública de Subsídios (TPS) que coloca em marcha a discussão para um novo sistema de rotulagem que também tem causado discussões para lá de apaixonadas. Sabe-se lá por que razão, numa discussão de tanta importância, a Anvisa reduziu o prazo para contribuições de 60 para 45 dias.
Nos três casos, mais do que coincidências, é possível perceber uma tendência cada vez mais consolidada de se buscar a intervenção do poder público para que grupos muito bem organizados e com grande poder de mobilização imponham seu modo de ver o mundo. No caso da proibição de exportação de gado vivo, por exemplo, a atriz e ativista Luiza Mel, bateu ponto na Alesp para fazer a defesa de interesse de sua causa. Com ela, centenas de jovens defensores do direito dos animais pressionaram parlamentares a aprovar o projeto de lei. Gente graúda e com histórico alinhamento com o agronegócio sucumbiu à pressão e a votação só não foi concluída até o fechamento desta coluna graças a manobras regimentais que, entre outras coisas, evitaram quórum para a votação.
No caso da Lei dos Alimentos Mais Seguros/Pacote do Veneno, o caso é inverso ao da exportação de gado vivo: em vez de tentar aprovar um projeto, o movimento, que conta com apoio de estrelas de primeira grandeza das redes sociais, tenta barrar sua tramitação, até agora sem sucesso, mas com muito barulho.
Para a discussão da rotulagem, que tramita na Anvisa, a pressão popular também é forte. Um grupo chamado Aliança Para Alimentação Saudável e Adequada levantou cerca de R$ 3 milhões com a Fundação Bloomberg para trabalhar o tema com uma campanha de comunicação bem estruturada que visa a endereçar a escolha do sistema chileno de rotulagem. Se adotado, rótulos passariam a receber um triângulo preto com alertas sobre teores de açúcar, sódio e/ou gordura. Um dos setores mais afetados seria o do leite in natura, por incrível que pareça. Isso porque a lactose se transforma em açúcar no organismo e, mesmo não havendo açúcar adicionado, existe uma corrente muito representada que defende alertas sobre o produto sob risco de “consumo excessivo de açúcar”. Sinceramente, não sei se essa turma está preocupada com o consumo de açúcar ou se a birra é porque o produto de origem animal, tenho minhas dúvidas sobre as motivações em curso.
Todas essas ações, cada uma com a sua particularidade, partem de uma premissas muito semelhantes de negação ao agronegócio: “O produtor só pensa em usar mais e mais veneno no campo, portanto há que se colocar freios”; “Alimentos de origem animal devem ser evitados ou de preferência banidos, então vamos proibir carne um dia por semana e barrar exportações de animais vivos”; “Açúcar é o novo tabaco e é preciso restringir o seu consumo”; “Suco de fruta engorda, então vamos falar que ele tem açúcar adicionado, mesmo que não tenha” e assim a coisa vai longe.
Infelizmente ao associarmos esses três exemplos, aos quais seria possível juntar tantos outros, percebe-se que a sociedade brasileira urbana se organiza ao redor de um sistema de confronto sistemático a quase tudo o que vem do campo. A cada dia é maior o contingente de pessoas que dá suporte a toda e qualquer causa que tenha o agronegócio como alvo e esse movimento, antes restrito às redes sociais, hoje frequenta gabinetes do legislativo e influencia tomadores de decisão, quando não são os tomadores de decisão parte desses movimentos.
Pode ser que o agronegócio continue a vencer suas contendas, como costuma fazer. Mas o jogo parece que vai ficar muito mais pesado e uma reflexão sobre como o setor se posiciona e a forma como comunica precisa ser mais assertiva urgentemente. Caso contrário caminharemos a passos largos para a criminalização da produção. E olha que falamos apenas de comida.