Trump dispara, China retruca. E isso é bom para soja brasileira

Enquanto o Brasil inteiro concentrava suas atenções para o julgamento do Habeas Corpus do ex-presi


04.04.18

Enquanto o Brasil inteiro concentrava suas atenções para o julgamento do Habeas Corpus do ex-presidente Lula no Supremo Tribunal Federal, pelo menos parte do universo do agronegócio brasileiro tinha uma outra disputa quentíssima para observar em tempo real nesta quarta-feira, 4 de abril. Estados Unidos (leia-se Donald Trump, o homem que ocupa a Casa Branca) e China se engalfinham numa guerra comercial que pode resultar em boas oportunidades para nossos produtores de soja e criadores de suínos. Na manhã desta quarta-feira, por exemplo, a notícia que balançou os mercados internacionais do grão foi a confirmação de que o governo chinês vai retaliar fortemente a decisão americana de sobretaxar as importações de uma série de produtos de tecnologia Made in China. O anúncio de Beijing, que impôs uma tarifa adicional de 25% nas importações de commodities americanas (entre elas soja, trigo, milho, algodão, sorgo, fumo e carnes bovina e suína), caiu como um míssil sobre os exportadores dos Estados Unidos e teve ampla repercussão nos principais estados produtores do país, que figuraram entre os principais redutos eleitorais de Trump.

Primeiro reflexo imediato do contragolpe chinês foi a desvalorização das cotações da soja americana em Chicago, principal mercado para contratos de commodities. O preço para entregas em maio caíram 5,3% logo em seguida ao anúncio das retaliações, maior variação negativa desde 2016. Algodão e milho também caíram. Já para o produto brasileiro, as expectativas são inversas. A soja brasileira tem obtida sucessivas valorizações nos últimos 30 dias, desde que começou a se especular qual seria o tamanho da resposta de Beijing ao ataque de Trump. A interpretação é simples: com o castigo aos americanos, a principal alternativa à China — que compra nada menos que US$ 14 bilhões em soja americana ao ano — é vir buscar o produto no Brasil. Segundo informações obtidas pela Bloomberg, o prêmio para a soja brasileira embarcada por Paranaguá subiu 63%  nesse período.

“A resposta chinesa carrega tanto peso econômico como político, uma vez que os  estados agrícolas estão em regiões com grande apoio a Trump”, disse à Bloomberg Monica Tu, analista na Shanghai JC Intelligence Co. De fato, a pressão política da América rural, com forte representação no Partido Republicano, já começou a ser sentida em Washington. No estado de Iowa, no coração da principal zona produtora de grãos no país, as principais lideranças lançaram alertas nos últimos dias, acusando Trump de criar condições para uma crise sem precedentes. Já na data do anúncio das sobretaxas americanas, a Iowa Soybean Association (Assocciação dos Sojicultores de Iowa) emitiu uma nota dizendo que a ação de Trump “impõe uma imediata e grave ameaça à indústria e à agricultura” do estado. Mike Naig, secretário de Agricultura, e Joni Ernst, senador por Iowa, se apressaram em afirmar que o governo deveria expandir mercados, e não encolhê-los. Já o senador Chuck Grassley, outro republicano de Iowa, usou uma expressão do próprio Trump para criticá-lo: Tarifas não colocam a América em primeiro lugar. Menos barreiras e maior acesso a mercados, sim.”

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A tensão entre Trump e seus eleitores das regiões agrícolas não é nova. As ações protecionistas do presidente preocupam os produtores praticamente desde o início de seu governo, quando ele iniciou embates com os vizinhos México e Canadá, grandes importadores de produtos americanos. Trump também demorou a definir seu secretário de Agricultura, postergando a definição das principais políticas para o setor. Agora, porém, a escala é bem maior. Em artigo no The New York Times, Robert Leonard, influente radialista de Iowa, resumiu bem o sentimento local: “Donald Trump ganhou mais de 60% dos votos na área rural de Iowa, onde eu vivo, em 2016, e não tenho ouvido muita preocupação dos republicanos sobre as alegadas infidelidades do presidente com uma triz pornô, suas ligações com a Rússia ou as trapalhadas imobiliárias de Jared Kushner (genro do presidente)”, escreveu. “Mas as pessoas aqui — tanto republicanos quanto democratas — estão prestando grande atenção ao que o presidente Trump está fazendo no campo econômico, especialmente desde que começou a falar de tarifas”.

 

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