Edição 1 - 11.11.16
Por Denize Bacoccina, de Brasília
No dia 31 de agosto, pouco mais de uma hora depois de tomar posse como efetivo presidente da República no Congresso, o presidente Michel Temer reuniu o primeiro escalão para uma reunião ministerial. Disse que deveriam trabalhar pela eficiência do governo e sugeriu que copiassem o ministro da Agricultura. “Quero pedir a todos que nos respectivos ministérios criem um grupo para desburocratizar”.
O ministro Blairo Maggi apresentou um plano, depois que um grupo trabalhou reduzindo as dificuldades burocráticas em 63 pontos”, disse o novo presidente. A menção é uma amostra do prestígio que Blairo conquistou junto ao chefe poucos meses no cargo. Em um momento em que os investimentos ainda não saem do papel e a indústria e o consumo sofrem os efeitos da recessão, é no agronegócio, que representa metade das exportações e 21,5% do PIB brasileiro, que estão depositadas as esperanças do governo por boas notícias.
O plano que encantou Temer, batizado de Agro Mais, havia sido anunciado uma semana antes, numa disputada cerimônia no Palácio do Planalto. Foi uma espécie de faxina nas portarias no Ministério, abolindo ou simplificando normas ultrapassadas ou em desacordo com as regras internacionais, que deve gerar uma economia estimada pelas empresas em R$ 1 bilhão.
Blairo estava cumprindo a única ordem que recebeu do presidente, quando disse que nunca tinha tido chefe e queria saber como se portar. “Olha, Blairo, eu quero que você cuide da agricultura, que eu sei que você entende desse negócio. E eu só quero saber das notícias boas”, disse Temer. De agricultura, de fato Blairo entende. A família, gaúcha, migrou para o Paraná quando ele ainda estava na barriga da mãe. Duas décadas depois, foi uma das primeiras a desbravar o Mato Grosso, tornando-se um dos maiores produtores de soja do mundo – a liderança só foi perdida há alguns anos, para o primo Eraí Maggi Scheffer. E nos últimos anos, passou a entender também de política. Governador do Mato Grosso entre 2003 e 2010, deixou o governo com 92% de aprovação, e se elegeu senador pelo estado.
PÉ NA ESTRADA
Em busca de notícias boas, Blairo não estava no Salão Oval do Planalto quando seu nome foi citado. Dentro de um avião da Emirates Airlines, estava a caminho de Dubai, onde faria uma conexão para a escala final em Xangai. Na China, participou de um seminário com empresárioschineses e brasileiros, acompanhou Temer na cúpula do G20 e seguiu para um giro rumo a outros seis países asiáticos – Coreia do Sul, Tailândia, Mianmar, Vietnã, Malásia e Índia. Foi acompanhado de uma comitiva de 40 empresários, de setores como carne, frango, couro, lácteos, madeira, açúcar, pescados, café e biotecnologia, e não escolheu a região por acaso.
A Ásia tem 51% da população e 19% do PIB mundial, e uma demanda por alimentos impressionante. Consome 28% das aves, 20% dos bovinos, 31% dos lácteos e 37% do açúcar produzidos no mundo. Blairo buscou assegurar que o Brasil está preparado para vender. “O agro brasileiro é muito diversificado e temos condições de atender a toda a população brasileira e as demandas mundiais”, afirmou aos investidores chineses, inaugurando uma nova fase das relações comerciais com a região, a diplomacia agrícola do Brasil.
Para países de população e economia crescentes, com grande demanda por alimentos e produção agrícola insuficiente, o Brasil pode ser um parceiro mais que estratégico – e Blairo quer se aproveitar desse trunfo para acelerar acordos e abrir novos mercados. Durante 25 dias, pegou 13 voos, ficou hospedado em 14 hotéis, participou de dezenas de reuniões e eventos públicos e insistiu que o mundo deve reconhecer, por meio de preferências comerciais, que o País presta um serviço ao planeta ao produzir alimentos ao mesmo tempo que preserva a maior parte do seu território.
“O Brasil tem que ser reconhecido e pago por ter preservado o meio ambiente. Não em dinheiro, mas em preferências comerciais”, afirmou em entrevista a PLANT PROJECT dias depois de voltar de seu périplo.
A viagem rendeu entre US$ 1,5 bilhão e US$ 2 bilhões em investimentos e perspectivas de negócios, na avaliação do ministro. Várias negociações que se arrastavam há vários anos foram aceleradas. Aos coreanos, ele lembrou que o Brasil tem um mercado de 200 milhões de habitantes, que compra muitos produtos industrializados do país e espera ser tratado como um parceiro estratégico. “Não consigo entender porque vocês liberam carne bovina de países que podem oferecer muito menos contrapartidas e ainda não liberaram a nossa”, reclamou.
Conseguiu a promessa de que a abertura do país para carne suína brasileira pode sair até o início de 2017. Blairo também conseguiu a reabertura do mercado de carne bovina, suína e de frango no Vietnã, licenças de importação de carne, frutas e lácteos para Mianmar e a ampliação do mercado de carne de aves na Malásia.
Na China, as visitas em várias províncias podem resultar em oportunidades até então pouco exploradas pelas empresas brasileiras. “Nosso papel é fazer os acordos, agora cabe às empresas fazer negócios”, diz o ministro. E trouxe um deles na bagagem. A multinacional indiana UPL aproveitou a presença de Blairo por lá para anunciar que vai investir US$ 400 milhões em uma fábrica para a síntese de agroquímicos no Brasil e outros US$ 100 milhões numa cooperação com a Embrapa, para desenvolver sementes de grãos como lentilhas e grão-de-bico, para exportar para os indianos.
A busca por novos mercados é essencial para atingir a meta de aumentar de 6,9% para 10%, em cinco anos, a participação brasileira no mercado agrícola mundial – um negócio de US$ 1,1 trilhão. Para isso, é preciso acelerar os acordos internacionais. Um de fundamental importância foi a carta de reconhecimento de equivalência com os Estados Unidos. Entregue em agosto, ela encerra um processo que começou em 1999 e vai permitir a exportação também para outros mercados, que usam o processo americano como referência. O primeiro lote, da Marfrig, já desembarcou nos Estados Unidos na última semana de setembro (leia reportagem nesta edição de PLANT).
DIÁLOGO COM O SETOR
O diálogo com os empresários do setor, que andava meio truncado, foi aprimorado. “Aqui é a casa do produtor, podem contar comigo”, afirma o ministro. Além de receber representantes de entidades e empresários, Blairo foi ver a produção de fumo no Rio Grande do Sul, de ovos em São Paulo, de maçã em Santa Catarina e de café em Minas Gerais. A todos, levou o mesmo recado: o governo não tem dinheiro, portanto não contem com subsídios e se empenhem para exportar mais.
Mesmo com o cofre trancado, Blairo tem agradado aos produtores, satisfeitos por ver um deles no comando da pasta. “Peguei o primeiro cartão dele como ministro, vou pelo menos uma vez por semana com um assunto diferente e estamos contentes com o tratamento”, diz o presidente da Aprosoja Brasil, Marcos da Rosa. “Ele tem planos ambiciosos e, como empresário de sucesso que é, está dando uma característica empresarial para o Mapa”, elogia Carlos Alberto Paulino da Costa, presidente da Cooxupé, cooperativa de produtores de café no sul de Minas Gerais e Vale do Rio Pardo, que recebeu a visita do ministro em agosto.
“O ministro já chegou em velocidade de cruzeiro e, para o setor da laranja, em pouco tempo teve atuação decisiva”, afirma Ibiapaba Netto, diretor executivo da Citrus-BR, entidade que representa a indústria exportadora de sucos cítricos. Um exemplo foi a mudança na legislação referente ao combate ao cancro cítrico, doença que afeta os pomares, uma demanda dos produtores que era discutida com o Mapa, sem sucesso, há cerca de sete anos. “Tive a felicidade de receber essa notícia dele em uma audiência”, afirma Netto. “Vemos com muito bons olhos esse início acelerado da sua gestão”.
EXPEDIENTE COMEÇA CEDO
A nova postura também vale da porteira para dentro. No Bloco D da Esplanada dos Ministérios agora o expediente começa cedo e termina cedo – para os padrões da Esplanada – e impôs um ritmo empresarial ao Ministério, com reuniões objetivas e com resultados práticos. Blairo chega ao gabinete entre 7h30 e 8 horas da manhã, e não costuma ficar além das sete da noite. “O que eu não consegui resolver de dia, não é à noite que vou resolver”, diz.
Também contrariando a prática brasiliense, é extremamente pontual. Começa e termina as reuniões no horário previsto, mesmo que o interlocutor não tenha terminado. “Passarinho cantou, a sua audiência acabou”, brinca, apontando para um relógio, na parede, que tem um canto de pássaro a cada hora cheia.
Muito apreciada por técnicos e funcionários da pasta é a maneira cordata de tratar a equipe e a objetividade nas decisões – a antecessora, a também senadora Kátia Abreu, era criticada pela postura centralizadora. Blairo é diferente. “Ele ouve, pergunta a nossa opinião, não interrompe”, conta um técnico. Uma vez tomada a decisão, no entanto, todos já sabem que é melhor não insistir. Blairo não sabia como era ser chefiado, mas sabe ser chefe.
“O GOVERNO NÃO PODE É ATRAPALHAR O AGRONEGÓCIO”
O senhor começou a usar esse conceito de ativo ambiental, sustentável, na Ásia. Deu certo?
Deu certo. A receptividade é muito boa. Nós não temos retórica só, temos a prática. Usamos apenas 8% do território para agricultura e preservamos 61%. Nós merecemos preferências.
Qual a sua expectativa para aumentar as exportações para a Ásia?
Isso depende do empresariado brasileiro. A função do governo é abrir, mostrar, negociar os certificados, acabar com os entraves. Agora vai depender da capacidade dos produtores de persistirem, correrem atrás.
É o agro que vai segurar a economia no governo Temer?
É o agro que tem segurado a economia nos últimos 20, 30 anos. O governo não pode é atrapalhar o agronegócio.
Qual foi a maior dificuldade que encontrou no Ministério e onde acha que mais avançou?
A dificuldade sempre é mexer com a máquina pública. O Agro Mais é uma resposta para isso. Precisamos transferir dinheiro da ineficiência para a eficiência, tirar a burocracia para deixar as empresas mais baratas, mais livres.
Vai mudar a lei para permitir a propriedade de terras para estrangeiros?
Eu defendo que sim, que o mercado deve ser livre. Culturas permanentes como floresta, celulose, cana de açúcar, não teriam restrição nenhuma. Já na questão de produção de grãos a gente tem que ter mais cuidado para evitar que fique na mão de estrangeiros.
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