
Estive na Espanha na semana passada, quando o assunto mais comentado, em todos os cantos de Madrid, era a posse das ministras do Pedro Sanchez, o novo primeiro-ministro, bonitão e socialista. Das 17 pastas, 10 foram ocupadas por mulheres. Fui logo me interessando em saber sobre o Ministério da Agricultura e descobri que esta vai ser ocupada, agora, por um homem chamado Luis Planas.
Segundo me disse o espanhol que dividiu comigo um banco na Plaza Mayor (e não tirava o olho da minha
marmitinha saudável, humpf!), Planas “ainda” vai ter trabalhar em parceria com a ministra do Meio Ambiente, Teresa Ribera. Respondi “que bueno” me achando “a fluente em espanhol” e o ranzinza desatou a falar alto, bem bravo. Foi a hora de ligar o modo avião do cérebro e deixar o machista gastar energia à toa. Nem ligo, eu sorrio. Ofereci uma uva e ele saiu (será que tinha uma semente presa no meu dente?).
Consegui ler o jornal do dia horas depois, já no hotel. O homem estava certo. Pedro Bonitão separou algumas demandas que antes eram da Agricultura e as passou para o Ministério do Meio Ambiente: água, meio ambiente e mudanças climáticas. Tudo divididinho.
Até então, na Espanha, as questões agrícolas e ambientais caminhavam juntas. Nos últimos sete anos, elas recaíram sobre duas mulheres: Roza Aguillar e Isabel García Tejerina, ministras da Agricultura entre os anos de 2010-2011 e 2015-2016, respectivamente. Já entrevistei as duas (a Roza, em 2011, e a Isabel, em 2016) durante a abertura de uma megafeira de frutas e legumes que acontece anualmente em Madri, a Fruit Attraction. A Roza, era o tipo de “ministra-raiz”: chegou de tênis, estava com fome, comeu uma ameixa e limpou a boca com a mão e foi lá cortar a fita. A Isabel fazia mais a “ministra-nutela”, de salto, toda produzida, e muito educada. Foi lá e cortou a fita também.

O fato é que as duas mulheres da agricultura espanhola conseguiram, em alguns anos, transformar o setor em algo esplêndido. A Espanha se consolidou como um grande fornecedor de frutas e legumes para toda a Europa, América e Ásia. Foi lá que eu comi couve-flor roxa, melão insuportavelmente doce, maçã pink quadrada, e pude ter acesso a alguns projetos (de grandes multinacionais de sementes) cujos resultados só chegarão ao mercado em dois ou três anos. Ainda. O país, de repente, atraiu tecnologia, comida boa e diferente.
Por conta do trabalho das duas ministras, a Espanha também se abriu a novos mercados, incluive ao Brasil. Isso porque eles precisam abastecer o mercado europeu durante o inverno. A saída é importar frutas e legumes e distribuir. Roza e Isabel trabalharam bastante para conseguir manter o mercado abastecido, e ainda, atrair fornecedores sem perder a competitividade.

Os jornais espanhois apontaram que o maior desafio do Planas vai ser, exatamente, manter essa competitividade no setor de frutas e legumes. A Federação Espanhola de Associações de Produtores Exportadores de Frutas e Legumes (FEPEX) já solicitou ao novo ministro a aplicação de um marco regulatório que não gere distorções de concorrência efetiva na União Europeia e facilite o acesso aos novos mercados. A Federação das Indústrias de Alimentos e Bebidas (FIAB), em carta, também já pediu que ele siga a linha das antecessoras… e para completar, ele ainda vai ter que coordenar a Reforma da Política Agrícola Comum, o que inclui, a pedido da União Europeia, um corte direto de subsídios de 3,5% a 15% nos fundos de desenvolvimento rural espanhois.
Em outras palavras, um dos poucos homens do Pedro Bonitão vai ter que dançar miudinho pra dar continuidade ao trabalho de suas antecessoras.