As uvas de Santa Catarina

Cada região vinícola do mundo produz vinhos diferentes – mesmo quando elaborados com as mesm


24.02.23

Irineu Guarnier Filho é jornalista especializado em agronegócio, cobrindo este setor há três décadas. Metade deste período foi repórter especial, apresentador e colunista dos veículos do Grupo RBS, no Rio Grande do Sul. É Sommelier Internacional pela Fisar italiana, recebeu o Troféu Vitis, da Associação Brasileira de Enologia (ABE), atua como jurado em concursos internacionais de vinhos e edita o blog Cave Guarnier. Ocupa o cargo de Chefe de Gabinete na Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul

Cada região vinícola do mundo produz vinhos diferentes – mesmo quando elaborados com as mesmas uvas. É o que se chama de terroir, palavra francesa sem uma tradução exata em português, mas que significa a soma das características de solo, clima, plantas e da intervenção do homem na elaboração dos vinhos de cada região. Um vinho feito com a uva Cabernet Sauvignon em Santa Catarina, ou no Vale do São Francisco, jamais será igual a outro Cabernet Sauvignon elaborado na Califórnia, por exemplo. Todas as regiões vinícolas do mundo produzem, pode-se dizer, vinhos únicos. Essa é a beleza do mundo vinho!

A Serra Catarinense é uma das mais jovens regiões vinícolas do Brasil – mas seus vinhos já apresentam características próprias. A colheita da uva, por lá, acontece cerca de um mês após a vindima na Serra Gaúcha, já no começo do outono. As uvas amadurecem mais lentamente e concentram mais aromas, sabores e cores. Por conta do clima frio e da altitude da região, acima de 1.300 metros em alguns pontos, os vinhos catarinenses são muito frescos e elegantes. A região tem grande potencial para a produção de espumantes, vinhos brancos e tintos leves. Na minha modesta opinião, os vinhos brancos catarinenses são os melhores do Brasil, disparado.

Mas, afinal, quais são as uvas que mais têm se destacado na Serra Catarinense para a elaboração de vinhos brancos? De novo, na minha opinião, a Sauvignon Blanc é o grande destaque entre as variedades brancas cultivadas em Santa Catarina. De origem francesa, a Sauvignon Blanc se adaptou muito bem ao planalto catarinense, e muitos dos vinhos locais premiados até fora do país são elaborados com essa casta. O principal descritor aromático dela é o maracujá, que aparece no primeiro momento em que aspiramos os aromas do vinho, o chamado “primeiro ataque”. Esses vinhos têm toques minerais, complexidade aromática e são muito elegantes. Mas, claro que Chardonnay e outras castas também rendem bons vinhos.

Nos tintos, as uvas que mais se destacam na Serra Catarinense são as variedades de origem italiana Sangiovese e Montepulciano, ainda pouco conhecidas no resto do país, inclusive na Serra Gaúcha, região colonizada por imigrantes italianos. Essas uvas se adaptaram muito bem ao clima úmido e frio da região. Eu destacaria ainda uma outra uva cultivada em Santa Catarina que tem servido de base para excelentes vinhos tintos mais leves: a Pinot Noir. Originária da Borgonha, na França, a Pinot Noir é uma uva delicada que gosta de frio. Já provei vinhos catarinenses excelentes, de corpo médio, elaborados com esta cepa.

Mas, e a Cabernet Sauvignon, outra uva francesa que se espalhou pelo mundo e rende bons vinhos em quase todas as regiões onde é cultivada? Acredito que a Cabernet Sauvignon é um caso bem especial em Santa Catarina. Variedade de ciclo longo, geralmente ela se adapta melhor às regiões mais quentes e ensolaradas, como a California, o Vale Central do Chile ou a Campanha Gaúcha. Mas já provei excelentes vinhos catarinenses feitos com Cabernet Sauvignon. E, o que mais me chamou a atenção nesses vinhos: um delicioso aroma de goiaba, cujo o sabor se confirma depois na boca, ao primeiro gole. Até um Icewine, ou vinho do gelo, já foi feito aqui em São Joaquim com esta uva – mas isso é assunto para outra coluna.