É preciso recuperar a narrativa em temas do Agro

É preciso recuperar a narrativa em temas do Agro   Plinio Nastari   Embora desempenhe pap


25.10.22

É preciso recuperar a narrativa em temas do Agro

 

Plinio Nastari

 

Embora desempenhe papel de protagonista na segurança alimentar global, o Brasil há anos perdeu a narrativa sobre a produção agropecuária sustentável e não tem participado da construção das normativas em torno de um novo arranjo para o comércio global desses produtos. Mesmo preservando mais de 66% do seu território conforme dados da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), referendados pela Nasa, e usando somente 7,8% de toda sua extensão para o cultivo agrícola, o País não consegue ser visto como um produtor sustentável, embora seja um dos maiores fornecedores do mundo em volume. 

Em uma economia globalizada, quem detém a narrativa tem vantagem competitiva sobre os demais. No caso da agricultura, a narrativa geralmente tem se centrado nos países países-membros da União Europeia, a exemplo da França – cujo presidente Macron alegou equivocadamente, em 2020, que a produção de soja brasileira poderia estar atrelada ao desmatamento de florestas.  

Essa e outras mentiras propagam-se de maneira a prejudicar a imagem da atividade agrícola brasileira, mesmo com dados provando o contrário. A situação se torna mais desafiadora quando se avalia as normativas estabelecidas por outrem que não levam em conta as especificidades da agricultura do Brasil. Por isso a urgente necessidade de que sejam adotados critérios de certificação para a produção nacional que levem em conta as características especificas específicas da agricultura tropical aqui desenvolvida com inegável e reconhecido sucesso, adaptando métricas e metodologias à realidade do nosso País com base em Ciência ciência de vanguarda para conseguirmos legitimar o que é aqui produzido.

Para reverter esse quadro, o trabalho deve começar no nosso quintal. Apesar de grande parte dos agricultores brasileiros seguirem à risca o nosso Código Florestal – que, diga-se de passagem, é o mais rigoroso do mundo –, a vilanização do setor deve-se, também, a uma falha na comunicação, sobretudo para aqueles que vivem em grandes centros urbanos e desconhecem a verdadeira realidade da agricultura praticada no território nacional. 

O dever de casa passa pelo trabalho educativo de crianças e adultos para mostrar que a principal atividade da economia brasileira segue rigorosos critérios de sustentabilidade, e que as principais regiões produtoras não estão no bioma amazônico ou qualquer outro bioma protegido. A imprensa também tem atuação crucial nesse processo, principalmente a não especializada, cuja abrangência maior é de fundamental importância para levar a mensagem para milhões de brasileiros e aproximar cada vez mais o campo da cidade.

Os desafios são grandes. Um dos erros crassos é a “autocomunicação”, ou seja, estamos quase o tempo todo falando para nós mesmos. Chegar ao grande público de forma clara deve ser um dos objetivos centrais do setor, que muitas vezes peca na dosagem e acaba transformando o debate em um embate entre ambientalistas e produtores, e esse, definitivamente, não é o caminho. Precisamos mostrar que agricultura e sustentabilidade andam juntas em prol do desenvolvimento econômico e social do Brasil. 

Devemos realçar que, além de alimentos de qualidade, nossa agricultura produz energia limpa, o que nos coloca muito à frente dos demais nas discussões acerca da descarbonização. Por meio de resíduos da cana, o governo federal planeja, até 2030, a geração de 45 milhões de metros cúbicos por dia de biogás e derivados, a exemplo do biometano, que é 90% menos poluente do que o diesel. Esse volume de gás é equivalente a praticamente duas vezes a capacidade do gasoduto Brasil-BoliviaBolívia, e um terço de toda a geração de gás do País. Já a política de Estado RenovaBio reconhece o papel estratégico dos biocombustíveis na segurança energética nacional, assegurando a previsibilidade para o mercado de combustíveis e contribuindo para a mitigação das emissões dos gases causadores do efeito estufa. Em suma, o setor sucroenergético brasileiro é exemplo de sustentabilidade para todo o globo.

Feita a lição de casa, cabe às entidades representativas mostrar para o mundo todas as iniciativas, muitas delas de vanguarda, que são adotadas aqui. Como celeiro da Terra, temos, por competência, a necessidade de tomarmos de volta a narrativa e participarmos de forma ativa e construtiva na construção da normativa atualmente em discussão na agricultura.