Como um príncipe provocou uma crise ecológica

A ciência descobriu há muito tempo que a maioria dos ecossistemas são sensíveis a forasteiros. S


Edição 29 - 18.04.22

A ciência descobriu há muito tempo que a maioria dos ecossistemas são sensíveis a forasteiros. Se uma espécie que não é nativa for introduzida em algum ambiente saudável, há boa chance de a invasão gerar desequilíbrios. Os japoneses são a prova definitiva dos estragos que seres estrangeiros podem provocar. Confira a seguir como um príncipe bem-intencionado – mas desconhecedor das relações de causa e efeito na natureza – provocou uma verdadeira carnificina nos rios e lagos do Japão.

O presente

Em 1960, o príncipe Akihito, herdeiro do trono japonês, visitou Chicago. Apaixonado por peixes, ele ganhou do prefeito da cidade um presente inusitado: 18 bluegills, o peixe oficial do estado de Illinois. Akihito levou os exemplares para o Japão, mas não poderia imaginar o que sua decisão significaria um erro histórico.

A missão

De volta ao Japão, Akihito impôs uma missão à Agência Nacional de Pesca do Japão: eles deveriam criar em cativeiro os bluegills e depois soltá-los nos lagos japonesas. Pedido de príncipe cumpre-se à risca e foi exatamente isso o que os pesquisadores fizeram.

A infestação

Os bluegills se tornaram milhares em cativeiro e, logo depois, começaram a ser soltos na natureza. Na década de 1990, o bluegill havia colonizado todos os ecossistemas de água doce do país. Só então descobriu-se que isso era um problema, mas já era tarde demais.

O predador

Os bluegills são comedores vorazes. Alimentam-se de insetos, plâncton, plantas aquáticas, ovas de peixes nativos e qualquer coisa que se mova e for menor que eles. No início do século, o invasor passou a representar 90% de toda a fauna do Lago Biwa, o maior do Japão, que já abrigou 30 espécies de peixes nativos.

O contra-ataque

No início do século, o governo japonês enfim percebeu que os bluegills eram um sério problema. Foi quando nasceu um programa de estímulo à pesca e uma campanha nacional para inspirar japoneses a comer esses peixes. Restaurantes lançaram novidades como o sushi bluegill e uma empresa chegou a criar um hambúrguer feito da espécie. Nada disso adiantou.

O socorro da genética

Agora, geneticistas japoneses estão às voltas com um projeto ambicioso: usar os recursos da edição genética para esterilizar os bluegills. Os cientistas sequenciaram o genoma do infame invasor e produziram peixes machos que transportam um gene estéril, eliminando sua capacidade de reprodução. Se os bluegills modificados forem introduzidos na natureza, espera-se que, em alguns anos, eles diminuam consideravelmente o número de exemplares da espécie.

A polêmica

Boa parte da opinião pública japonesa é contra a introdução de peixes geneticamente modificados na vida selvagem. Eles argumentam que não há estudos sobre os impactos que a iniciativa provocaria nos ecossistemas. Temem que um erro do passado leve a outro no futuro. Enquanto isso, os bulegills bluegills continuam fazendo estragos nas águas do Japão.