Edição 10 - 30.08.18
Por Pedro Romanos
O condado de Shropshire, no oeste da Inglaterra e perto da fronteira com o País de Gales, é uma das regiões mais bucólicas do Reino Unido. Extensos campos verdes, colinas a perder de vista, pastos com ovelhas, fazendas centenárias e um ritmo de vida cadenciado conferem à região uma atmosfera nostálgica, como se o passado ainda vivesse ali. Isso até pode ser verdadeiro, mas o outro lado dessa história mostra que Shropshire oferece também um caminho para o futuro. É lá que se desenvolve uma das grandes revoluções da agricultura mundial. Mais precisamente, nos laboratórios da Universidade Harper Adams, fundada em 1901 e hoje em dia um dos principais centros globais de pesquisa agrícola avançada (há dois anos, a instituição criou a primeira fazenda totalmente controlada por robôs). Depois de uma década de estudos, testes, erros e acertos, o trabalho de uma vida do professor Simon Blackmore começou a se tornar realidade. Trata-se do robô “Hyperweeder”, construído para realizar um pequeno milagre da tecnologia: seus olhos atentos e braços precisos atacam as ervas daninhas – e apenas elas – que corroem lavouras inteiras, preservando a planta e permitindo que ela cresça e floresça.
Há duas versões do Hyperweeder. Em ambas, o conceito é o mesmo: um emaranhado de câmeras, sensores e softwares é capaz de identificar até 26 espécies de ervas daninhas. Funciona assim: o robô caminha tranquilamente pela lavoura, checando planta por planta até reconhecer aquela que foi atacada por um malfeitor. Se o processo de detecção de organismos estranhos é o mesmo, a execução dos ataques pode ser feita de formas diferentes. É aí que entram em serviço as duas versões dos robôs.
A primeira delas está equipada com um dispositivo que emite raios laser em direção às ervas daninhas, aniquilando-as para sempre. Os raios produzem uma onda de calor de 95 C°, suficiente para matar as pragas – e só elas. Essa é a grande inovação do professor Blackmore. Os feixes de lazer emitidos pelos robôs têm um grau de precisão impossível de ser repetido por mãos humanas. Segundo Blackmore, os raios localizam os meristemas (tecido de crescimento das plantas) e queimam apenas o local necessário, como um cirurgião delicado que extrai um tumor maligno para salvar o paciente. Até hoje, nenhum experimento parecido havia alcançado resultados tão consistentes quanto os robôs da Universidade Harper Adams. Não é difícil imaginar como a novidade será bem-vinda para os produtores orgânicos que abominam o uso de defensivos químicos nas lavouras.
A segunda versão do Hyperweeder executa o mesmo serviço, mas de um jeito diferente. Em vez de emitir raios laser, o canhão de calor dá lugar a uma espécie de pistola de pulverização. Um herbicida similar ao glifosato, o mais utilizado no mundo, é disparado apenas nas ervas daninhas, sem interferir nas áreas saudáveis da lavoura e em dosagens precisamente direcionadas. Segundo cálculos feitos pelos pesquisadores da Harper Adams, a nova tecnologia tem potencial para economizar em até 99% o uso de defensivos. “Os resultados de nossos experimentos são extraordinários”, disse o professor Blackmore durante uma apresentação para cientistas britânicos. “O Hyperweeder revelou-se altamente eficiente e pode representar uma das maiores revoluções da agricultura nos últimos anos.”
As novas tecnologias estão em fase experimental, mas estima-se que não vai demorar muito para que elas comecem a ser adotadas em larga escala. Seu efeito será brutal em todas as frentes de negócio. Os produtores que adotarem os robôs emissores de laser não gastarão um centavo sequer com pesticidas. Os que optarem pela versão com pistola de pulverização desembolsarão muito menos com esses produtos. Graças à eficiência dos robôs, a produtividade das lavouras irá aumentar e os impactos ambientais serão reduzidos sensivelmente em relação aos métodos agrícolas atuais.
De acordo com os cientistas da Harper Adams, os robôs surgem em um momento-chave para o agronegócio. Com a diminuição das áreas para lavouras, o setor precisa encontrar meios capazes de aumentar a produtividade e ocupar espaços menores. “Hoje faltam tecnologias apropriadas para otimizar as plantações”, disse o professor Blackmore ao portal de notícias alemão Deutsche Welle. “Os enormes tratores modernos têm vantagens quantitativas, mas exigem grandes áreas de cultivo.” Os pequenos robôs, prossegue o cientista, serão o único meio viável para suprir a produção no futuro, substituindo ceifadoras e máquinas gigantescas.
Além disso, tratores grandes e pesados compactam e machucam o solo. Isso faz com que, todos os anos, os agricultores tenham que arar áreas imensas antes da próxima temporada de plantio. O processo, nem é preciso dizer, custa caro. Tratores consomem combustível e horas de trabalho de profissionais para manuseá-los. E geram todo tipo de despesas. Quanto mais são utilizados, maiores são os gastos com manutenção.
O Reino Unido não está sozinho em robótica avançada para o agronegócio. No Brasil, a startup Smart Agri, nascida de uma incubadora da Esalq (Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz), em Piracicaba, interior de São Paulo, desenvolveu o Weed It, robô acoplado às máquinas agrícolas que pulveriza apenas áreas específicas da lavoura. A exemplo do modelo inglês, o Weed It detecta a presença de ervas daninhas e aciona a pulverização apenas sobre as plantas infectadas. “A tecnologia proporciona a redução de agroquímicos na faixa de R$ 100 por hectare”, diz o engenheiro agrônomo Marcos Nascimbem, sócio da Smart Agri.
Na Suíça, a ecoRobotix criou um robô pulverizador movido a energia solar, com 12 horas de autonomia – o equivalente a um dia inteiro de trabalho. Segundo a empresa, para surtir o mesmo efeito dos métodos tradicionais, o equipamento precisa de 20 vezes menos herbicidas. Pelo visto, as ervas daninhas estão com os dias contados. Os robôs-exterminadores vieram mesmo para ficar.
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