Quando a arte encontra a natureza 

Ano histórico para o Masp combina recordes de público e novo prédio com uma programação inteiramente dedicada à crise climática
Edição: 51
19 de novembro de 2025

Por André Sollitto 

O ano de 2025 ficará marcado na história do Masp, o Museu de Arte de São Paulo Assis Chateaubriand. Além de inaugurar um novo prédio, ao lado do icônico espaço projetado pela arquiteta Lina Bo Bardi (1914-1992), o museu bateu recorde de público graças à exposição com obras do pintor impressionista francês Claude Monet (1840-1926). E decidiu dedicar toda a sua programação expositiva a um dos temas mais importantes da atualidade: a crise climática. No ciclo Histórias da Ecologia, os curadores mostram como diferentes artistas olharam para a natureza e interpretaram o mundo ao redor. 

O museu bateu recorde de público graças à exposição com obras do pintor impressionista francês Claude Monet

A principal mostra é justamente aquela que dá nome ao ciclo. Histórias da Ecologia começou em setembro e ficará em cartaz até 1º de fevereiro de 2026, ocupando todos os cinco andares expositivos do novo prédio do Masp. São mais de 200 obras de artistas de 28 países, como Colômbia, Islândia, Japão, Nova Zelândia, Peru e Turquia. A exposição é dividida em cinco núcleos temáticos, que seguem uma linha do tempo da ecologia: Teia da Vida; Geografias do Tempo; Vir-a-ser; Territórios, Migrações e Fronteiras; e Habitar o Clima

De acordo com o museu, a própria escolha da palavra “ecologia”, em vez de “natureza”, tem um significado. “Ao contrário de concepções que isolam a natureza como entidade exterior à sociedade, a ecologia é compreendida como trama relacional, um campo de forças em constante transformação”, escrevem os curadores na apresentação da mostra. “Histórias da Ecologia transita entre diferentes saberes: o geológico, o biográfico, o ancestral, o espiritual, o comunitário, o local, o planetário. Essas interseções ampliam a visão sobre o que está em jogo na atual crise climática – não como um evento isolado, mas enraizado em estruturas coloniais e patriarcais que condicionam os modos de habitar o planeta”, afirma Isabella Rjeille, que assina a curadoria junto com André Mesquita.  

No ciclo Histórias e Ecologia, os curadores mostram como diferentes artistas olharam para a natureza e interpretaram o mundo

Outras exposições relacionadas ao tema foram realizadas pelo Masp desde o início do ano. Entre abril e agosto, a mostra Frutas Milagrosas retratou a relação da artista mexicana Hulda Guzmán com a paisagem impressionista, destacando sua contribuição ao gênero ao mesclar a paisagem com características arquitetônicas, realismo mágico e muralismo mexicano. Guzmán já havia produzido obras para outras exposições no Masp, mas esta foi sua primeira individual na América do Sul. 

Entre maio e agosto, foi a vez de A Ecologia de Monet, que se tornou a mais visitada da história do museu ao ultrapassar a marca de 410 mil pessoas. Ela superou Tarsila Popular, de 2019, que recebeu 402 mil visitantes, e Monet – O Mestre do Impressionismo, vista por 401 mil pessoas em 1997. Os curadores reuniram 32 obras do pintor francês que revelam sua relação, por vezes contemplativa e, por vezes, crítica com a natureza. A maior parte dos trabalhos nunca havia sido exibida no hemisfério sul e cobre toda a trajetória do artista. A seleção incluía telas produzidas em seu jardim, na casa em que viveu por mais de 40 anos em Giverny, e também paisagens que registravam os efeitos da modernização e das transformações ambientais. 

Até o final de outubro, o prédio principal do Masp exibe Reencontrar a Árvore, de Frans Krajcberg (1921-2017), pioneiro na integração entre arte e meio ambiente. O artista, de origem judaica e nascido na Polônia, tinha uma relação especial com a natureza. Perdeu a família na Segunda Guerra Mundial, chegou ao Brasil – onde se naturalizou em 1957 – e, na década de 1970, passou a viver no litoral sul da Bahia, no seu Sítio Natura, em Nova Viçosa, em meio à Mata Atlântica. Em esculturas e pinturas, algumas tridimensionais, outras bidimensionais, explorou a relação entre arte e natureza. Em vários de seus trabalhos, muitos expostos no Masp, usou resquícios de troncos, cipós, raízes e madeira como matéria-prima e inspiração. Para além da produção artística, tornou-se um ativista que lutava pela preservação do meio ambiente. Uma viagem à Amazônia, em 1978, resultou na publicação do Manifesto do Rio Negro, que propunha uma nova relação entre arte e natureza. 

Escultura do artista polonês Frans Krajcberg: pioneiro na profunda integração entre arte e o meio ambiente

Há ainda uma nova exposição que estreou recentemente. Trata-se de Abel Rodríguez (Mogaje Guihu): A Árvore da Vida e da Abundância, primeira mostra individual do artista colombiano após seu falecimento. Rodríguez (1941–2025) tornou-se conhecido pela contribuição única à representação e organização dos saberes ancestrais sobre a flora e a fauna da Amazônia colombiana. “Meu conhecimento não é biológico. Ele é materialmente, espiritualmente e sentimentalmente conectado à floresta, à energia dela”, afirmou o artista em 2024. Essa visão é retratada em quatro núcleos expositivos: Árvores Mitológicas, com desenhos baseados nas narrativas Nonuya-Muinane sobre a criação do mundo; Desenhos Botânicos, com aquarelas que traçam um paralelo entre o desenho ocidental e os sistemas classificatórios indígenas; Ciclos, sobre as diversas etapas da natureza; e Natureza Integrada, com as últimas obras produzidas pelo colombiano. Em 2025, o Masp não apenas quebrou recordes como também transformou a arte em um espelho urgente da crise climática. 

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