por Marco Damiani
Um sentimento de otimismo cauteloso envolveu os produtores do agro em relação à demanda por fertilizantes na safra 2024/25. As preocupações com uma disparada nos preços internacionais, em razão das vicissitudes do mercado externo, que seriam agravadas com a alta do dólar no Brasil a partir de dezembro do ano passado, não se concretizaram. Com compras antecipadas de suas demandas, dentro do planejamento de cooperativas agrícolas ou valendo-se do mercado “spot” – com entrega imediata e pagamento à vista –, a grande maioria dos produtores de grãos conseguiu obter preços em linha com os praticados na safra anterior. “De forma geral, por mais que exista uma relação de troca desfavorável, o mercado de fertilizante está estável”, diz o engenheiro agrônomo Armando Sugawara, consultor técnico do ramo Agropecuário do Sistema Ocesp (Organização das Cooperativas do Estado de São Paulo).“Essa estabilidade tem influenciado o comportamento de compra dos produtores rurais, que preferem adquirir fertilizantes de forma pontual (compra spot) em vez de fazer estoques grandes, devido ao risco de variação nos preços.”
De acordo com o Boletim Logístico de janeiro da Conab (Companhia Nacional de Abastecimento), as importações brasileiras de fertilizantes bateram, em 2024, o recorde dos últimos cinco anos. Em relação à safra anterior, o acréscimo de 8,3% nas compras totais, que chegaram a 44,3 milhões de toneladas de insumos, se explica pela dimensão da produção de grãos, que também será recorde, com projetadas 322,3 milhões de toneladas. O crescimento sobre a safra anterior é estimado em 8%, na exata proporção do acréscimo na compra de insumos. Ao mesmo tempo, o uso de bioinsumos produzidos no Brasil cresceu acima de 13% na safra em encerramento, cobrindo uma área plantada superior a 155 milhões de hectares. As projeções iniciais para a safra 2025/26 indicam que as compras internas podem dobrar de tamanho. “Ainda somos dependentes de compras no exterior, onde não definimos os preços, mas as perspectivas são de alteração gradual neste quadro”, diz o presidente da Anda (Associação Nacional para Difusão de Adubos), Ricardo Tortorella. “Com o Plano Nacional de Fertilizantes, que nós apoiamos e está ganhando tração, acreditamos que será possível chegar a 2050 com 50% do consumo sendo produzido no Brasil.”
Tortorella confirma que os preços internacionais dos fertilizantes não constituíram um problema grave para os produtores na safra atual. Mas destaca que, em razão da volatilidade do mercado, sensível a diversos fatores da conjuntura global, é sempre preciso mitigar riscos: “As culturas de maior valor agregado, como soja, algodão e milho, não estão sentindo diretamente as altas dos preços, porém as commodities, em que 30% do custo de produção tem origem nos fertilizantes, trazem consigo um desafio maior, demandando uma constante atualização dos cenários pelas cooperativas”.
Puxado pela cana-de-açúcar, o consumo de fertilizantes apresentou um aumento médio de 3% na safra atual em relação à anterior, de acordo com levantamento da Fecoagro (Federação das Cooperativas Agropecuárias). Na região, onde novas fronteiras agrícolas são exploradas, o crescimento foi superior a 5%. Em relação à soja, produtores dos estados do Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e Goiás reduziram, em média, o uso de adubos convencionais em cerca de 9%, em mais um indicativo do incremento no consumo de bioinsumos pelo agro nacional.
“O Brasil será líder em fertilizantes sustentáveis”

PLANT PROJECT – Qual é o cenário atual de desenvolvimento do Plano Nacional de Fertilizantes?
José Carlos Polidoro – O ceticismo de dois anos atrás, quando muitos duvidaram fortemente da retomada da produção de fertilizantes no Brasil, acabou. O que existe agora são resultados e um consenso de que estamos conseguindo retomar, com ganhos, a produção de fertilizantes dentro do País. Nós ainda importamos 80% das necessidades da safra, mas este foi o último ano desse volume. O mercado interno será atendido, gradativamente, pela indústria nacional.
PP – O que está sendo feito para atingir esse objetivo?
Polidoro – Duas plantas de nitrogenados no Nordeste, na Bahia e em Sergipe, estão saindo de uma fase de hibernação para retomarem a produção, numa parceria da Petrobras com a Unigel. No Amazonas, a fábrica de fertilizantes de potássio, da companhia Potássio do Brasil, já está em fase inicial de produção, interagindo comercialmente com o mercado. No segundo semestre do ano passado, a Petrobras retomou suas atividades na Ansa (Araucária Nitrogenados S.A.), no Paraná. No horizonte até 2028, o País conseguirá atender até 15% da demanda nacional por fósforo, com projeção de produzirmos 1,1 milhão de toneladas por ano. Vamos avançar muito em nitrogênio e potássio com base sustentável. No ano passado, reconhecemos 21 fábricas de fertilizantes sendo implantadas no País. É um universo bastante significativo em relação ao ponto zero em que estávamos um ano antes.
PP – Como está a interlocução do governo com a iniciativa privada do setor?
Polidoro – O diálogo agora é permanente. No âmbito do Confert (Conselho Nacional de Fertilizantes e Nutrição de Plantas), que foi recuperado e está sob a presidência do vice-presidente da República, reunimos representantes dos ministérios relacionados ao tema, além de executivos da iniciativa privada e da Petrobras. Tudo é discutido ali, com transparência sobre o planejamento e a execução.
PP – Onde se quer chegar?
Polidoro – O governo está coordenando a formação de uma grande cadeia produtiva em torno da retomada da produção de fertilizantes. Como também importamos tecnologia, estamos em condições de dar um passo seguro na tropicalização dos nossos produtos. Criamos o Centro de Inovação de Negócios, que está reunindo as melhores instituições que produzem tecnologia básica, da mineração à mesa, em fertilizantes sustentáveis, cadeias emergentes, biofertilizantes, bioinsumos e agrominerais. Há um planejamento estratégico.
PP – Qual é a estrutura desse arranjo produtivo?
Polidoro – O Centro terá oito sedes, sendo a principal, funcionando como um hub, no Rio de Janeiro. As outras ficarão no Paraná, Goiás, Minas Gerais, Bahia, Amazonas, Mato Grosso e São Paulo. A produção será temática, com potássio sendo produzido no Amazonas, bioinsumos no Paraná, agrominerais em Goiás, fósforo em Minas, nitrogenados na Bahia e insumos de base circular em São Paulo. O roteiro traçado entre as autoridades, a iniciativa privada e as entidades do setor irá levar o Brasil, nos próximos anos, à liderança mundial de fertilizantes com base sustentável.