Edição 6 - 11.10.17
Por Eduardo Savanachi
O produtor rural Guilherme Scheffer carrega um dos mais tradicionais sobrenomes agrícolas do Brasil. Há 34 anos seu pai, Eliseu Maggi Scheffer, fundou o Grupo Scheffer, que hoje produz algo em torno de 340 mil toneladas de grãos em mais de 120 mil hectares espalhados por fazendas na região de Sapezal, no Mato Grosso do Sul. Em seu “DNA agrícola” ainda constam nomes como o do seu tio, o megaprodutor Eraí Maggi Scheffer, considerado um dos “reis da soja” do país, rivalizando com o atual ministro da Agricultura e primo, Blairo Maggi. Mas, no caso de Guilherme, o uso do termo “tradicional” se limita ao seu sobrenome. Desde que assumiu a gestão financeira do grupo, há 13 anos, ele trabalha na implementação de um modelo de administração com mecanismos típicos de grandes multinacionais, cujo objetivo era fincar os pés em um habitat ainda hoje pouco explorado por empresários rurais: o mercado financeiro. Nos últimos meses, ele começou a colher o que plantou. Guilherme é o primeiro produtor a conseguir emitir, como pessoa física, um Certificado de Recebíveis do Agronegócio (CRA), título que gera direito de crédito a possíveis investidores e possibilita acesso a recursos financeiros fora da rede bancária.
Mais do que linhas de crédito mais barato, a emissão do CRA tem um papel estratégico para o futuro das lavouras da família, pois funciona como um tipo de chancela econômica em relação a gestão dos negócios, colocando o Grupo Scheffer no radar de investidores internacionais. O plano do produtor é tornar o nome do grupo mais conhecido no mercado com a emissão do Certificado e, com isso, ser capaz de captar recursos com juros mais baixos. “O ganho não é apenas uma possível redução de custo no futuro, mas sim o possível acesso a um novo ’bolso‘ de créditos”, afirmou a PLANT PROJECT.
De acordo com o produtor, esse é um segmento totalmente diferente do bancário. Nele, os recursos são acessados com um bom projeto que ofereça uma projeção financeira atraente e confiável. “Trata-se de um volume indefinido de recursos oriundos de investidores internacionais que precisam de um bom fator de risco versus retorno para entrar no negócio. E achamos ter essas condições”, diz Guilherme Scheffer. Ele ressalta que o alto custo da emissão do CRA se paga pela posição estratégica que ele possibilita. “Vamos começar a colher os frutos nos próximos dois anos, com o nome ficando mais conhecido no mercado e uma possível segunda emissão do Certificado”, planeja o produtor, que não fala de nomes nem valores. “Já estamos conversando com alguns fundos e observando que é possível estabelecer parcerias. Acreditamos que com o modelo de organização que temos hoje, já é possível alavancar bons negócios em parceria com esses agentes.”
O “modelo de organização” ao qual ele se refere envolve uma série de práticas administrativas, que mexem com toda a estrutura funcional do grupo. “Todo o processo que resultou na emissão do CRA é resultado de um trabalho de longo prazo para a estruturação da empresa.” Um dos principais exemplos é o balanço auditado, que permite que os resultados econômicos do grupo sejam comprovados. “Já estamos há 13 anos com o balanço auditado, nos últimos quatro anos feito pela KPMG”, ressalta. Além disso, outro aspecto importante está na política de transparência e gestão de risco, que gera uma série de regras para equilibrar o grau de risco que o grupo pode correr em cada tipo de operação. “São parâmetros que dão segurança ao investidor e tornam o grupo mais sólido”, complementa.
De acordo com a corretora Vert, que atuou como a securitizadora e emissora do CRA, o certificado funciona como um instrumento de captação de recursos destinados a financiar transações do mercado do agronegócio e é emitido com lastro em recebíveis originados de negócios entre produtores rurais, inclusive financiamentos ou empréstimos relacionados à produção, comercialização, beneficiamento ou industrialização de produtos. Ou seja, é um mecanismo atrelado diretamente à produção, sem o intermédio dos bancos, por isso a necessidade de comprovação de um modelo de gestão transparente e confiável para conseguir a aprovação da emissão. “Para ter acesso a esses mecanismos, é preciso profissionalizar a gestão administrativa e financeira da fazenda, tendo um histórico de bom pagamento junto a fornecedores e bancos, além de ter disponibilidade de dar garantias reais. No caso de Guilherme Scheffer, isso foi possível e resultou na primeira operação de grande produtor rural emitindo sozinho”, explica Fernanda Mello, sócia da Vert. Segundo Fernanda, o CRA é atrativo por causa da isenção de imposto que ele oferece ao investidor. “A vantagem é que investidores pessoa física têm isenção de IR quando investem em CRA e, com isso, os tomadores de recursos conseguem taxas mais competitivas e diversificam suas fontes de financiamento, tornando-se menos dependentes de bancos e fornecedores”, ressalta.
Aos 35 anos de idade, Guilherme é um dos exemplos de uma nova geração de produtores que começa a assumir as rédeas dos negócios de suas famílias, com autonomia para aplicar na prática o conhecimento adquirido durante os anos de estudos. Um perfil que o fez entrar no radar de um programa realizado pelo Rabobank, chamado Agrolíder, voltado para identificar e ajudar a lapidar novas lideranças rurais. “O programa é dirigido aos filhos de clientes que já fazem parte da gestão ou que pretendem assumir o negócio da família, podendo ser os futuros líderes do agronegócio”, explica a diretora do Rural Banking do Rabobank Brasil, Fabiana Alves. Na prática, o programa promove encontros anuais, com a realização de workshops e road shows nacionais e internacionais, em que jovens produtores podem desenvolver novos conhecimentos gerenciais para aplicação direta nos negócios da família, como finanças, análises de investimento, governança, sucessão e gestão de pessoas. De acordo com a diretora do Rabobank, que atuou como consultor durante o processo de emissão do CRA, a maturidade de gestão operacional, financeira e de governança do Grupo Scheffer são aspectos amplamente trabalhados no programa. “Enxergamos atualmente uma geração empreendedora que vê no agronegócio não só uma chance de dar continuidade ao negócio da família, mas também uma oportunidade de carreira”, diz.
Para Guilherme, a forma como essa nova geração foi inserida nos negócios da família é um dos principais fatores para o sucesso do modelo implantado. “Todo o processo de transformação de uma empresa familiar para um modelo mais corporativo é um trabalho que começou na primeira geração e está sendo consolidado pela segunda geração”, revela Guilherme, que conta que seu pai, Eliseu Scheffer, sempre se preocupou em atrair os filhos para os negócios da família. Dessa forma, cada um dos três filhos cuida de uma parte importante do grupo. O filho mais velho, Gilliard, cuida do planejamento operacional das lavouras, enquanto a irmã, Gislayne, é diretora administrativa.
Olhando os resultados do grupo, é possível ver que a sucessão tem dado resultado. Nas últimas seis safras, a produção de soja dobrou, passando de 120 mil para 240 mil toneladas. No caso do milho, a produção – que era de pouco mais de 15 mil toneladas na safra 2012/13 – passou para 120 mil hectares plantadas entre primeira e segunda safra, crescimento de 700%. O grupo ainda produz 60 mil toneladas de pluma de algodão e abate cerca de 12 mil cabeças de gado Nelore por ano. “Noventa por cento do faturamento do grupo vem da soja e do algodão. No caso do algodão, 81,65% do que é produzido pelo Grupo está dentro do tipo, na classificação visual, para os padrões de exportação.” Os planos para o futuro não são modestos e até mesmo uma abertura de capital do Grupo, embora afirme não estar nos planos, não é descartada. “Atuar no mercado de capital não é interessante no momento. Mas futuramente, se for, queremos estar preparados”, pondera Guilherme.
Por dentro do Grupo Scheffer
Onde produz
Sapezal (MT) e Maranhão
Como produz
11 propriedades agrícolas
Nas lavouras
Algodão
27 mil hectares ]68 mil toneladas de armazenagem de caroço de algodão
60 mil toneladas de pluma
66 mil toneladas de caroço
Soja
60 mil hectares
220 mil toneladas
Milho
14 mil hectares
120 mil toneladas
Pecuária
12 mil cabeças de gado abatidas por ano
Onde ganha
90% do faturamento vem da soja e algodão
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