Agrotrends: Índia, a próxima fronteira

Por André Sollitto O Vale do Silício, nos Estados Unidos, ainda é o principal ecossistema de inov


Edição 18 - 02.03.20

Por André Sollitto

O Vale do Silício, nos Estados Unidos, ainda é o principal ecossistema de inovação do mundo e continuará a receber a maior quantidade de recursos por algum tempo. Mas fundos de investimento buscam outros mercados com grande potencial. Quando o assunto é inovação no agro, a Ásia – e mais especificamente a Índia – representa a próxima fronteira a ser desbravada. Um relatório feito pelo AgFunder, referência global em investimento agtech, divulgado em novembro, aponta que 57% dos 50 fundos de venture capital entrevistados estão empolgados com as possibilidades oferecidas na região – muito mais que outros centros agrícolas mais tradicionais.

O que estariam os investidores enxergando em um país com um modelo fundiário baseado em milhões de pequenas propriedades que praticam agricultura de subsistência e que vive uma grande crise? A resposta talvez esteja nas oportunidades geradas por essa condição. Na Índia, uma nova leva de investidores prósperos (muitos oriundos do setor de tecnologia) está se dedicando a adquirir porções de terras dos agricultores e consolidá-las em propriedades maiores, que lhes permitirão trabalhar com mais escala e de forma tecnificada. De quebra, contratam os antigos donos como empregados. Com grandes porções de terras agricultáveis e um enorme contingente de trabalhadores – estima-se que mais de 500 milhões de indianos vivam da agricultura – acreditam que poderão transformar o país, em um prazo razoavelmente curto, em uma nova potência agrícola.

Questões geopolíticas auxiliam a vender essa ideia. A localização estratégica das lavouras indianas as colocam como potenciais fornecedoras para boa parte do gigantesco mercado asiático de alimentos. O continente é a maior fonte de demanda por proteína. Além disso, seus sistemas de produção e logística não têm a mesma infraestrutura encontrada em países desenvolvidos, o que significa que há muita oportunidade de causar um impacto significativo. Por fim, as agtechs podem ser muito relevantes para resolver problemas de qualidade do solo e da água na Ásia. Outras vantagens indicadas pelos investidores incluem o reconhecimento do inglês como idioma oficial na Índia, e o mercado de capitais fortemente estabelecido no país.

Nesse ambiente, a Índia representa um mercado com enorme potencial. Atualmente, tem 1,3 bilhão de habitantes, mas até 2024 deve ultrapassar a China e liderar o ranking de população. São muitas bocas para alimentar – e a cadeia de produção de alimentos é especialmente problemática no país. Outro relatório realizado pelo AgFunder, publicado em dezembro de 2018, investigou o ecossistema de inovação agfoodtech indiano. Entre 2013 e 2017, foram investidos US$ 1,66 bilhão, uma quantia pequena se comparada aos US$ 10 bilhões que foram captados pelas startups globalmente apenas em 2017, mas o valor de cada aporte é menor, reflexo dos custos reduzidos para manter um negócio no país.

No período indicado pela pesquisa, muitos empreendedores indianos têm focado seus esforços na busca por soluções para atender à crescente classe média, que saltou de 24 milhões de pessoas, ou 11% da população, em 2005, para 57 milhões, ou 21%, em 2016. A ascensão social veio acompanhada por uma mudança nos hábitos de consumo: eles buscam mais qualidade e comodidade em todas as etapas da cadeia. Com isso, houve uma proliferação de serviços de delivery e marketplaces on-line. Não à toa, a Swiggy, líder entre os marketplaces de restaurantes, captou US$ 1 bilhão em uma rodada de investimentos em 2018 e passou a ser avaliada em US$ 3,3 bilhões.

O perfil de startups que despertam o interesse dos investidores também diz muito sobre o perfil de cada ecossistema. Nos Estados Unidos e na Europa, por exemplo, o foco é em agbiotech – outra das tendências apontadas por nossa reportagem. Na Ásia, de maneira geral, o interesse é em softwares de gestão da fazenda, soluções de agricultura digital, marketplaces on-line de insumos agrícolas e serviços de delivery.

Confira as outras tendências identificadas pela nossa reportagem:

Agbiotech para mudar o mundo

Produção em escala, cuidados individuais

Até onde vão as proteínas alternativas

Uma década para as agfintechs

Um setor com menos intermediários

Cannabis e o medo de uma viagem errada

Cultivo high tech: a segunda geração das fazendas urbanas

O consumidor como protagonista

Pulses: vida nova para os antigos grãos

Pecuária 4.0 vai digitalizar os rebanhos

Agricultura regenerativa

As proteínas que vêm da água

A tecnologia promove o bem-estar animal

TAGS: AgFunder, Índia, Swiggy