Agrotrends: Cultivo high tech e a segunda geração das fazendas urban

Por André Sollitto O ambiente das fazendas verticais que têm surgido nos últimos tempos parece sa


Edição 18 - 02.03.20

Por André Sollitto

O ambiente das fazendas verticais que têm surgido nos últimos tempos parece saído diretamente de um filme de ficção científica. Hortaliças são cultivadas em torres com vários andares de altura, e toda a produção é banhada por uma iluminação rosa, resultante de luzes azuis e vermelhas que simulam o Sol. Da mesma maneira, prometem resolver alguns dos principais problemas da agricultura, como o uso intenso de recursos naturais e a falta de espaços cultiváveis.

A atenção dada ao formato vem aumentando. Prova disso é o interesse dos investidores. Entre 2015 e 2016 foram investidos US$ 60 milhões em startups de agricultura vertical. Entre 2017 e 2018, o número saltou para US$ 414 milhões. Em 2018, o mercado foi avaliado em US$ 2,3 bilhões. Embora a maior parte desses aportes esteja concentrado concentrada nos Estados Unidos e na Europa, o fenômeno é global. Um levantamento feito pelo hub de fomento agtech The Mixing Bowl, especializado em conectar grandes empresas e agtechs, aponta que já são mais de mil empresas trabalhando no que chamam de “agricultura indoor”. Existem algumas delas em operação no Brasil. É o caso da Pink Farms, que neste ano recebeu um aporte de R$ 2 milhões e inaugurou um centro de produção em São Paulo na região do da Ceagesp, maior centro atacadista de alimentos do País.

A ideia de cultivar hortaliças em uma ambiente controlado não é exatamente nova. Mas as soluções que vemos agora integram a segunda geração de fazendas verticais. A primeira é marcada pelo controle e monitoramento da irrigação, iluminação, nutrientes, pH, temperatura do ar, umidade e quantidade de CO2. A segunda geração de tecnologias consegue analisar e otimizar o processo de cultivo a partir de dados coletados. O resultado é um rendimento até 55 vezes maior do que uma fazenda tradicional.

E a agricultura vertical é apenas uma vertente do cultivo urbano. As mesmas tecnologias podem ser aplicadas em menor escala em contêineres. A rede de lojas de móveis IKEA está testando o formato na Suécia, oferecendo hortaliças cultivadas localmente nos restaurantes de algumas de suas unidades. E existem as startups dedicadas à produção em coberturas de prédios. O caso mais emblemático é o da startup francesa Agripolis, que se prepara para inaugurar a maior fazenda em uma cobertura no mundo. Localizada no 15º arrondissement de Paris, ela terá um restaurante e um bar para 300 pessoas. Obviamente, diversos pratos e drinques servidos lá terão ingredientes locais. A abertura está prevista para 2020. No Sudeste Asiático, os governos de Singapura, da Malásia e das Filipinas têm incentivado a agricultura urbana de forma a contornar a falta de espaço cultivável nessas regiões.

Mas é preciso ter cautela. Durante os últimos anos, o pesquisador americano Caleb Harper cativou outros pesquisadores, maravilhou plateias e arrecadou investimentos com sua proposta de construir um “computador da comida”, principal tecnologia da Open Agriculture Initiative (ou OpenAg), iniciativa do Media Lab do Massachussets Institute of Technology (MIT), um dos principais polos de inovação do mundo. A proposta era aparentemente simples: desenvolver caixas em que o cultivo de plantas poderia pudesse ser feito sem o solo, em qualquer lugar do mundo. A tecnologia seria responsável por garantir o ambiente ideal, e as informações coletadas seriam usadas para otimizar o plantio. O problema é que os resíduos eliminados pelo sistema foram considerados impróprios por autoridades locais. Uma reportagem do jornal The New York Times mostrou que Harper deu declarações exageradas ou falsas sobre os resultados de seu projeto tanto para patrocinadores quanto para jornalistas e para o público de suas palestras.

A consequência foi desastrosa. O MIT suspendeu as atividades de todo o departamento responsável pelo OpenAg, e ex-funcionários disseram que computadores da comida enviados a escolas não funcionavam. Outros contaram que fotografias do laboratório foram feitas com hortaliças compradas em mercados locais. Todo o setor de agricultura indoor sofreu um golpe, já que seus impactos ambientais e a sustentabilidade econômica desse modelo de negócios ainda não são totalmente conhecidos. A agricultura urbana e vertical ainda representa uma importante revolução, mas o caso do OpenAg mostra que a transparência é a chave para a longevidade do formato.

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TAGS: Agripolis, Caleb Harper, IKEA, MIT, Pink Farms