Nas lavouras de soja também se colhe o futuro

Uma das grandes conquistas de José Antonio Gorgen, diretor-presidente da Risa S.A., foi exportar um


Edição 7 - 03.05.18

Uma das grandes conquistas de José Antonio Gorgen, diretor-presidente da Risa S.A., foi exportar um navio de soja para a China em 2015. A satisfação pessoal por trás desse feito não deixa dúvidas sobre quão estimulantes são os desafios para esse gaúcho de Não-Me-Toque

Por Romualdo Venâncio | Fotos Emiliano Capozoli, de Balsas (MA)

Patrocínio: Mitsubishi Motors

A passagem de 2017 para o ano de 2018 será movimentada na sede do grupo Risa S.A., um dos principais empreendimentos agropecuários do Matopiba, região formada por nacos dos estados de Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia e que se tornou um grande polo do agronegócio nacional. Na pacata Balsas, no coração do cerrado maranhense, o produtor José Antonio Gorgen, presidente do grupo, desenha um novo cenário para seus negócios, impulsionados pela retomada do faturamento, que em 2017 deve fechar com receita superior a R$ 600 milhões, colaborando para minimizar a baixa performance de 2016, quando a receita foi de R$ 396 milhões. A outra parte desse momento de superação vem pelos projetos que ampliarão a estrutura e a abrangência dos negócios, que hoje conta com seis fazendas distribuídas por Maranhão e Piauí, somando 70 mil hectares agricultáveis – sendo 58,5 mil com soja, cerca de 25 mil para a próxima safrinha de milho e em torno de 12 mil destinados ao sorgo branco –, além de atuar nos segmentos de defensivos, fertilizantes, máquinas, logística e trading. Para Gorgen, a retomada do bom desempenho em 2018 fará com que as coisas aconteçam, e vice-versa.

 

Logo no início do ano, os olhos do empreendedor estarão voltados para Brasília. Lá, o Banco Central receberá toda a documentação do grupo solicitando a autorização para a criação de uma financeira. A ideia é que a nova empresa comece a operar como plano piloto em 2019 e, no ano seguinte, de forma efetiva. “Financiamos muitos produtores, especialmente pequenos e médios, por meio da troca com grãos. Fornecemos insumos como sementes, defensivos e fertilizantes e recebemos sua produção”, explica Gorgen. A implementação dessa financeira impulsionará os negócios e, segundo o empresário, disponibilizará um crédito melhor aos agricultores. “Várias empresas do setor agrícola já trabalham assim, não estamos inventando nada”, acrescenta.

“São 19 anos acompanhando a bolsa de Chicago praticamente todos os dias. Isso equivale, em tempo, a quatro ou cinco cursos universitários”

Gorgen também pretende investir em um sistema de irrigação em Baixa Grande do Ribeiro, no Piauí. Ele afirma ser um projeto revolucionário para a região, baseado em práticas sustentáveis, inclusive o fornecimento de energia. “Quero viajar o mundo para ver a implementação desse sistema em outros países. Faremos todo o trabalho de pesquisa durante 2018”, comenta. Essa infraestrutura, que estará pronta em 2019 ou 2020, permitirá acrescentar o algodão às culturas produzidas pela empresa. Outra iniciativa em relação à produção agrícola é o plantio de soja orgânica, mas levará um pouco mais de tempo, podendo acontecer entre 2020 e 2025. “É algo que exige grande investimento e necessita de uma estrutura física exclusiva no porto, onde será feita a segregação dos grãos”, explica Gorgen. “Na fazenda, tenho condições de realizar essa separação.” O principal objetivo é agregar valor à colheita. “Estamos buscando clientes interessados nesse produto e que paguem por esse diferencial”, afirma.

LONGA JORNADA

Gorgen não se assusta com desafios. Na sala de reuniões de seu escritório administrativo, em Balsas, ele possui dois painéis que simbolizam a trajetória da Risa. De um lado, uma tela reproduz uma fotografia feita em 1985, à época da sua primeira colheita de soja na região, com um caminhão atravessando a via alagada em meio ao plantio. A versão original, ainda em papel, fica em um porta-retratos sobre a mesa. Na parede oposta está a imagem do navio que saiu do Brasil, em 2015, rumo à China, levando um carregamento exclusivo da empresa com 65,12 mil toneladas de soja. “Era um sonho antigo que serviu para quebrarmos um paradigma. Por diversas vezes ouvimos que não seríamos capazes. Hoje, não fazemos mais cargas só nossas, pois não é a melhor opção em termos econômicos. Mas naquele momento um navio 100% nosso tinha um significado e tanto”, relata Gorgen.

A distância entre essas imagens vai muito além do espaço que separa as paredes daquela sala, dos 30 anos que intercalam o clique de ambas e até dos mais de 3 mil quilômetros percorridos por Gorgen para chegar à região. Envolve inúmeras histórias de sonhos, planos, objetivos, desafios, conquistas, dificuldades e superação. Natural de Não-Me-Toque, no Rio Grande do Sul, e filho de produtores rurais, o empresário chegou de vez a Balsas no dia 18 de agosto de 1984, dirigindo aquele mesmo caminhão da foto, um Mercedes-Benz, modelo MB 1113 Toco, azul, carregando dois tratores e alguns equipamentos. “Na época, eu tinha apenas 19 anos. Meus pais me emanciparam para que pudesse iniciar essa jornada, pois a maioridade era aos 21 anos. Vim sozinho para morar aqui”, conta o agricultor.

A distância entre essas imagens vai muito além do espaço que separa as paredes daquela sala, dos 30 anos que intercalam o clique de ambas e até dos mais de 3 mil quilômetros percorridos por Gorgen para chegar à região. Envolve inúmeras histórias de sonhos, planos, objetivos, desafios, conquistas, dificuldades e superação. Natural de Não-Me-Toque, no Rio Grande do Sul, e filho de produtores rurais, o empresário chegou de vez a Balsas no dia 18 de agosto de 1984, dirigindo aquele mesmo caminhão da foto, um Mercedes-Benz, modelo MB 1113 Toco, azul, carregando dois tratores e alguns equipamentos. “Na época, eu tinha apenas 19 anos. Meus pais me emanciparam para que pudesse iniciar essa jornada, pois a maioridade era aos 21 anos. Vim sozinho para morar aqui”, conta o agricultor.

Gorgen se orgulha do crescimento contínuo dos negócios e afirma que mesmo em anos mais difíceis, como foi 2016, a Risa não retrocedeu. “Houve momentos em que tivemos de parar, arrumar a casa, colocar tudo em ordem antes de seguir em frente. Mas jamais demos um passo atrás”, confirma o agricultor, que destaca o avanço em área independentemente das crises. Na década de 1990, período essencial nesse processo de evolução, Gorgen assistiu a uma palestra de Fernando Homem de Melo, professor da USP e especialista em economia do agronegócio, sobre a importância de o produtor olhar para dentro e para fora da porteira. Foi a partir daquele, até então, novo conceito que se desencadeou a formação de um grupo empresarial e a Risa entrou também nos demais segmentos. Quanto mais crescia fora da porteira, melhores se tornavam as condições do lado de dentro. “Com uma revenda de máquinas, por exemplo, estou sempre atualizado sobre o que há de melhor e mais moderno em relação aos equipamentos, quais as principais novidades do mercado, lançamentos, novas tecnologias, tudo isso aprimora meu plantio e minha produtividade”, explica o empresário.

DIFERENCIAL

A chegada do plantio direto potencializou a performance das lavouras da Risa, sobretudo nas áreas em que a pouca chuva restringe a disponibilidade de água. Gorgen comenta ter sido um fator decisivo para aumentar o desempenho das lavouras, pois a palhada deixada sobre o solo permite plantar mais cedo no ano seguinte. “A melhoria das duas safras ainda tem impacto positivo no solo, criando um ciclo de evolução: há um desenvolvimento superior da estrutura da planta, com raízes mais amplas, o que otimiza a nutrição da cultura, favorecida ainda pela maior umidade da terra”, detalha.

“Houve momentos em que tivemos de parar, arrumar a casa, colocar tudo em ordem antes de seguir em frente. Mas jamais demos um passo atrás”

O conhecimento sobre a fisiologia das plantas e o correto uso das terras têm sido fatores pontuais na diferenciação e no progresso das lavouras do grupo. É essa relação de equilíbrio nutricional do solo, capacidade de retenção de água e bom desenvolvimento do sistema radicular das plantas que tem permitido produzir mais com o mesmo custo, ou até com custo menor. “Não adianta a gente exagerar no adubo, sem equilíbrio, porque só vai conseguir uma planta grande para tirar foto, pois não vai produzir tão bem”, alerta Gorgen. É por isso que o produtor não abre mão das áreas de experimentação nas fazendas.

É por meio das experiências de campo que se consegue, por exemplo, desenvolver projetos como o plantio de sorgo branco feito de avião. Além do melhoramento genético dessa variedade, os testes levaram ao aperfeiçoamento da técnica para a distribuição das sementes, que são produzidas pelo próprio grupo e acabam reduzindo o custo. A soma de tecnologia, conhecimento e persistência cria o ambiente para tal evolução. Gorgen conta que levaram alguns anos até que definissem o timing correto para plantar. “A partir daí conseguimos uma boa safrinha de sorgo, melhor ainda quando o inverno se estende. Mesmo se não colhermos bem, a lavoura deixa uma palhada muito boa, o que favorece a produtividade da soja.” O sorgo branco foi escolhido por não conter tanino e ter maior aceitação comercial.

MELHOR NEGÓCIO

A soja da Risa é comercializada tanto no mercado externo quanto no interno, e a porção que vai para cada um dos destinos depende do comportamento do mercado. Atualmente, a maior parte – cerca de 70% – é destinada à exportação, e Gorgen acredita que essa divisão não deva mudar nos próximos anos, até pela maneira como a logística da empresa foi estruturada. Os caminhões não circulam vazios, seguem para o porto com os grãos e retornam carregados com matéria-prima para a fabricação de fertilizante. “Temos um contrato de exportação com uma empresa que tem negócios no Brasil, mas vendemos para ela em Genebra (Suíça). É uma transação de longo prazo com planejamento mês a mês dos embarques”, afirma o empresário. A estratégia logística também fun­ciona para a venda no mercado interno. A maior parte da produção de soja está no Piauí, onde o grupo tem boa parceria com uma grande esmagadora.

“O mercado sempre tem duas mãos, uma que dá e outra que toma”

Gorgen tem fama de conhecer bem o momento certo de fazer negócio com sua produção. Para ele, é apenas uma questão de prática e dedicação. “São 19 anos acompanhando a bolsa de Chicago praticamente todos os dias. Isso equivale, em tempo, a quatro ou cinco cursos universitários”, compara. O empresário comenta ser um conhecimento adquirido pela experiência, pela vivência, e fazendo um acompanhamento para o seu próprio negócio, não como trader. Para tomar as melhores decisões, foi preciso aprender a ter sangue frio. “Você tem de evitar as vendas na baixa, mas também não pode estar sem nada negociado, ou as contas chegam e faltam recursos para pagá-las. O mercado sempre tem duas mãos, uma que dá e outra que toma”, orienta. As questões econômicas exigem equilíbrio tanto quanto as agronômicas.

Companhia Aérea Oficial

A habilidade como negociador fica ainda mais relevante pelo fato de não ser possível agregar valor à soja, ainda que a qualidade do grão propriamente dito seja superior. Trata-se de uma commodity, então os preços são determinados internacionalmente pelo mercado de acordo com as características físicas e não proteicas do produto – teor de ardido e de umidade e quantidade de impurezas. Gorgen acredita que isso possa mudar e as negociações de soja venham a ter premiações como as do milho. “O Brasil tem o melhor milho de exportação do mundo, que é o safrinha. Por ser produzido no final do ciclo de chuvas, não tem tanto problema de entrar água nas espigas, o que garante um grão de melhor qualidade”, observa o empresário. “Paga-se um prêmio por isso, embora não seja alto e chegue muito pouco dessa recompensa para o agricultor”, acrescenta.

QUASE NATIVO

Gorgen está há mais tempo no Maranhão do que viveu no Rio Grande do Sul. É por isso que quando perguntam se ele é gaúcho responde ser “maraúcho”, e completa dizendo ser até mais maranhense. “Me adaptei bem aqui e aprendi a gostar da região desde que cheguei”, diz o não-me-toquense, pela certidão de nascimento. “Além disso, acho que a gente faz um pouco de diferença, pois pegamos terras improdutivas e mudamos sua realidade. E o que é melhor, estamos aqui desenvolvendo tecnologias pa­ra produzir comida”, afirma.

Essa identificação com a região o estimulou, inclusive, a entrar na disputa pelo cargo de vice-prefeito de Balsas nas eleições de 2012. Gorgen não venceu, mas isso não diminuiu seu envolvimento com o lugar. O empresário chegou, por exemplo, a doar parte de suas terras para a construção de um aeroporto regional que poderia fazer conexão entre Brasília (DF) e São Luís (MA). “O avião que faz essa rota passa a uns 40 quilômetros daqui (da Fazenda Roseira, onde o entrevistamos), o que não é nada para uma aeronave. Cerca de 450 mil habitantes poderiam ser atendidos por esse aeroporto”, afirma. Infelizmente, o projeto continua emperrado em trâmites burocráticos. Diferentemente do que aconteceu em Uruçuí, no Piauí, onde houve a doação do terreno pela Risa e a licitação para a construção do aeroporto já saiu. “Agora, esperamos apenas a conclusão do processo legal de doação do espaço ao estado para as obras começarem.”

 

José Antonio Gorgen

JOSÉ ANTONIO GORGEN

52 anos

Diretor-presidente do Grupo Risa

Filhos: Alan, Anderson, Andrei e Daniel

Faturamento: R$ 600 milhões (previsão 2017)

Áreas de atuação: produção agrícola, fertilizantes, defensivos, máquinas, logística e trading

Área total: 70 mil hectares distribuídos em seis propriedades

Produção: 58,5 mil hectares plantados com soja
e produtividade média de 55 sacas/ha; cerca de 25 mil hectares para a próxima safrinha de milho; e em torno de 12 mil hectares
com sorgo branco

Hobbies: andar de moto, pescar, fazer churrasco com os amigos e cuidar do Landau 1981 que ganhou de um amigo: “É uma relíquia que quero deixar para meus filhos. O carro está ótimo e andando bem, é só bater a partida que dá para viajar até o Rio Grande do Sul”.

TAGS: Grupo Risa, José Antônio Gorgen, Soja, Top Farmers